EM TOM MELANCÓLICO:José Sarney faz discruso d despedida no Senado
O FIM: Falando para um plenário vazio, Sarney se despede do Senado
GABRIELA GUERREIRO
FOLHA DE S. PAULO/DE BRASÍLIA
Após
59 anos de vida pública, o senador José Sarney (PMDB-AP), 84, fez nesta
quinta (18) seu discurso de despedida do Congresso. Com a mais longeva
carreira da política brasileira, Sarney não terá mandato a partir de
2015 porque decidiu não disputar as eleições de outubro.
No último discurso
no Legislativo, o peemedebista fez duras críticas ao sistema político
brasileiro e defendeu mudanças nas regras das empresas estatais para
evitar ações de corrupção como as que atingiram a Petrobras.
Sarney disse que as
denúncias que envolvem a estatal "envergonham" o país e prometeu
reapresentar projeto, de sua autoria, que cria um estatuto para as
estatais.
"Eu vou deixar como
última presença minha no Legislativo esse projeto. Se tivesse sido
feito, nós não teríamos esse problema que estamos tendo e lamentando, e
de certo modo está envergonhando o Brasil, que é o problema da
Petrobras."
Ao defender uma
ampla reforma política que inclui o fim do financiamento privado das
campanhas eleitorais, Sarney disse que seu principal "erro" foi ter
permanecido na vida pública após deixar a Presidência da República.
"Penso que é
preciso proibir que os ex-presidentes ocupem qualquer cargo público,
mesmo que seja eletivo. Foi um erro que cometi ter voltado."
Sarney disse não
ser possível mais "tolerar" o sistema político brasileiro, responsável
por "todo o resto" que acontece no país. O peemedebista defendeu a
redução no número de partidos, a maioria formada por "feudos pessoais",
assim como a implementação do sistema parlamentarista no Brasil.
"A presidente Dilma marcará a história do Brasil se fizer essa mudança de regime para o país."
Sarney também
defendeu o fim das medidas provisórias, instrumento que o peemedebista
considera a "deformação" do regime democrático. "O Executivo legisla e o
parlamento fica no discurso. As leis são da pior qualidade e as MPs
recebem penduricalhos que nada têm a ver com elas para possibilitar
negociações feitas a serviço de lobistas."
O senador disse ser
favorável à fixação de um teto para as doações privadas às campanhas
eleitorais, assim como o voto distrital e lista fechada para a escolha
dos candidatos.
DISCURSO
Sarney falou para
um plenário vazio. O peemedebista escolheu o primeiro horário dedicado
aos discursos na sessão de quinta-feira –que é tradicionalmente
esvaziada no Senado –para fazer sua despedida. A escolha, segundo ele,
foi proposital.
"Eu quis fazer cedo para que não tivesse ninguém mesmo, para falar para as cadeiras vazias. Mas a Casa está enchendo", afirmou.
Diversos senadores
foram ao plenário homenagear Sarney. Com o fim do mandato, ele disse que
vai dedicar seu tempo ao seu único hobbie: a leitura. "Acredito que
passei 20% da minha vida lendo. Não tenho outra dedicação para encher
meu ócio, senão o prazer de ler."
No discurso, o
senador fez um histórico de suas principais propostas e ações na vida
política, com destaque para as voltadas ao setor cultural. "A minha
causa, que sempre busquei aqui, foi a cultura. Por ela lutei e para ela
deixei alguns instrumentos", afirmou.
O senador encerrou
sua fala, antes de receber as homenagens de colegas, com um poema feito
para a ocasião. Em um trecho, afirma que deixa no Senado uma palavra:
gratidão. "Saio feliz, sem nenhum ressentimento. Ai, meu Senado, tenho
saudades do futuro."
HISTÓRICO
Presidente da
República que assumiu o cargo na transição entre a ditadura militar
(1964-1985) e os governos democráticos, Sarney foi deputado federal,
senador e governador do Maranhão. Assumiu o comando do país por ser vice
de Tancredo Neves, que morreu após adoecer na véspera de tomar posse,
em 1985.
Em seu governo,
implantou o Plano Cruzado e viu o país ser dominado pela inflação
crescente. Entregou o governo com a economia desestruturada, mas é
reconhecido como um dos fiadores da estabilização política do país.
Ocupou seu primeiro
mandato na Câmara dos Deputados em 1955, quando tinha 25 anos. De lá
para cá, se elegeu para três mandatos na Câmara, outros quatro no
Senado, além de ter governado o Maranhão. É membro da Academia
Brasileira de Letras e foi colunista da Folha.
O peso político de
Sarney decaiu ao longo do governo Dilma Rousseff. Apesar de manter suas
indicações no governo, a maioria das decisões cotidianas relativas à
aliança PT-PMDB foi tomada pela trinca Michel Temer (vice-presidente),
Renan Calheiros (presidente do Senado) e Henrique Eduardo Alves
(presidente da Câmara).
Apesar do novo
cenário, Sarney continuou sendo ouvido sobre questões importantes ao
PMDB. Mas deixou o protagonismo que alcançou durante o governo Luiz
Inácio Lula da Silva, quando presidiu o Senado e esteve no centro das
decisões do país.
O ex-presidente o
blindou durante a grave crise decorrente da revelação de que o Senado
tinha diversas nomeações feitas por meio de atos secretos, quando o
petista disse que o peemedebista não podia ser tratado como "uma pessoa
comum".
Em 2009, no comando
da instituição, foi protagonista do escândalo em que 511 medidas
administrativas deixaram de ser publicadas. O caso motivou dez
representações contra Sarney, todas arquivadas pelo Conselho de Ética da
Casa, na época controlado por aliados.
Parentes de Sarney,
do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e de vários outros senadores foram
contratados e exonerados da Casa por meio desse mecanismo. Apesar da
crise, acabou reeleito para o Senado em 2011.
O senador ainda
teve o nome envolvido nos desdobramentos da Operação Boi Barrica da
Polícia Federal, que envolveu seu filho do meio, o empresário Fernando.
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