CARNAVAL: QUANDO A GESTÃO DESLEIXA A PRODUÇÃO OU QUANDO O BRILHO FICA REFÉM DO VENTO
Por Euclides Moreira Neto
Estivemos no último final de semana na Praia Grande onde estão
concentrados os principais eventos carnavalescos da cidade de São Luís para a
temporada 2016. Registre-se que o festejo momescos deste ano conta com a
novidade da parceria compartilhada entre os governos do Estado e da Prefeitura
de São Luís – sem dúvida uma novidade reclamada há anos na prática cultural
desta região.
Ao andar pelas ruelas e logradouros onde havia palco armado para
apresentações artísticas com os grupos afras, baterias de escolas de samba e
outras manifestações culturais do nosso período carnavalesco, constatamos
indignado que havia uma frieza por parte dos organizadores em relação aos
grupos que se apresentavam naquela região da cidade. Citamos como exemplo, a
escuridão com que as baterias das escolas de samba tiveram que se apresentar.
Normalmente, em espaços onde há palco armado, tradicionalmente as
baterias dos grupos carnavalescos (escolas de samba, blocos tradicionais,
blocos organizados, tribos de índios, etc) ficam em frente ao palco,
reservando-se a parte alta do palco para os intérpretes e a ala de harmonia,
que ocupa o seu espaço interior. Sendo assim, ficam iluminados apenas os
ocupantes da parte interna do palco, deixando-se dezenas de ritmistas,
passistas, casais de mestre-sala e portas bandeira, no escuro.
Para não dizer que os ritmistas, casais de porta-bandeira e
mestres-salas, passistas e demais integrantes das baterias que não subiram ao
palco ficavam no escuro, o técnico responsável pela iluminação ligava a luz geral
voltada para o público ao final dos sambas executados, o que era muito pouco,
pois o público estava ali para ver a integralidade dos integrantes dos grupos
convocados e não somente os intérpretes e a ala de harmonia (cavaquinistas,
violonistas, banjeiros, etc.).
Reclamações foram feita aos apresentadores dos palcos, mas estes
alegavam que não tinha nada com isso, pois sua função era a de apresentar as
atrações convidadas, enquanto a iluminação era de responsabilidade do técnico
de iluminação. E assim foi conduzida toda a audição que poderia ter um brilho
bem maior se as atrações estivessem adequadamente iluminadas, pois para piorar
a função cultural, veio à chuva e dispersou boa parte do público.
O mesmo não pode dizer da produção que atuou no Festival de Música
Carnavalesca do Mirante, quando também mobilizou dezenas de foliões e lotou a Praça
Nauro Machado. Ali se percebia uma produção mais engajada com o fazer cultural
e o brilho pode ser percebido pela plateia, que assim ficou mais confortável
para apreciar as composições selecionadas para participar daquela audição
festiva.
Destaque-se que os concorrentes do festival de música carnavalesca da TV
Mirante providenciaram também uma produção extra para os intérpretes de suas
composições, o que naturalmente tornava-se uma atração à parte para aquele
evento. Mesmo que a produção dos intérpretes fosse motivo de chacota - pois
cabia muito bem ao momento - uma vez que se tratava de um festival de
marchinhas carnavalescas, que quase sempre apresentam em suas construções
duplos sentidos nas suas afirmações, isso possibilitava a satisfação do cidadão
comum que estava ali para traduzir os diversos signos e significados sugeridos
por cada produção.
Na semana anterior, nós haviamos estado no Parque Folclórico da Vila
Palmeira (agora chamado Huberto de Maracanâ) e constatamos que havia uma
ausência completa de público, principalmente porque o referido Parque
localiza-se em uma das regiões mais carentes da capital maranhense, portanto
percebemos que houve algo errado, a falta de comunicação entre os produtores e
organizadores da atividade cultura (que naquela ocasião foi identificada como
Ensaio Aberto, tendo faltado abrir a informação para o público, que se tivesse
sido avisado, compareceria).
Estes dois exemplos nos mostra o que estamos tentando afirmar desde o
início – é necessário haver congruência entre o fazer cultural com o público,
pois somente isso irá possibilitar a formatação de uma cumplicidade entre si. É
necessário que os gestores, organizadores, integrantes das equipes executoras
da atividade cultural se doem para que ela aconteça plenamente, pois caso
contrário vai passar uma ideia sem alma, sem perpeções compartilhada, onde os
idealizadores não estão nem aí para o que se pretende produzir ao nível de
interação entre grupos, artistas e o público.
Aproveitamos
esta deixa para compartilhar o comentário feito pelo economista e carnavalesco Dominguinhos
Lopes, da Escola Flor do Samba, que afirma categoricamente que “Há cada ano o
amadorismo se acentua e torna-se uma constante no planejamento e na execução
dos eventos culturais da nossa terra... falta ALMA nos inseridos no contexto e
visão do empreendedorismo com vistas busca de receitas e a satisfação popular
aos habitantes da cidade que tem um potencial imenso a ser explorado... mais as
gestões estão deitadas em berço esplendido empurrando com a barriga e
garantindo seu quinhão egoístico... É TRISTE MAIS É VERDADE!”.
Queremos aqui
invocar as teorias de Antonio Gramsci (1891-1937), conceituado sociólogo
comunista, de origem italiana, que defendia a tese de Intelectual Orgânico,
que, segundo ele, esse elemento seria a cabeça pensante de lideranças para
conduzir subalternos a executar tarefas, cabendo nesse contexto à cadeia produtiva
em que está inserido aos demais participantes. Assim vejo os integrantes
daquela rede criativa que envolve a execução do projeto carnavalesca de nossa
cidade.
Desse modo, os
gestores daquela atividade nada mais são que os indivíduos pensantes na produção
artística, portanto cada um é um intelectual ativista, não cabendo à
passividade sugerida pelo técnico de iluminação. O Intelectual é
um individuo dedicado a estudar e produzir reflexão crítica sobre a realidade, e comunica suas idéias com o objetivo de
influenciá-la, atingindo um status de autoridade para o público do mundo da cultura, como
criador ou mediador intervém no mundo da política propostas para defender ou denunciar injustiças concretas, e produzir ou estender ideologias e defender esses ou outros valores.
Por outro lado, o Intelectual orgânico a
que nos referimos acima é um tipo de intelectual que se mantém ligado a sua classe social originária, atuando como seu
porta-voz. Dessa forma, os gestor e organizadores da atividade carnavalesca na
Praia Grande, em pleno centro histórico da capital.
Maranhense, estava a exercer uma função
fundamental de intelectualidade que para pela liderança e observação a todos os
detalhes envolvidos com a realização da atividade, não se justificando a frieza
do técnico iluminação ou qualquer outro integrante envolvido com aquela
atividade. Algo não está funcionando bem, que venham as cabeças e mandem
consertar o que está funcionando mal ou não esteja funcionando, pois o público
está ali para ser particinte ativo e seria bom sair com um clima de satisfação
espiritual.
Segundo Gramsci,
em suas reflexões teóricas, cada grupo social fundamental com papel decisivo na
produção engendra seus próprios intelectuais, ditos "orgânicos".
Assim, a classe burguesa, ao desenvolver-se no seio do antigo regime, traz, consigo, não apenas o capitalista, mas também uma série de figuras
intelectuais mais ou menos distantes dele: o técnico da indústria, o administrador, o economista, advogado, o organizador das mais distintas esferas
do Estado etc. Tais intelectuais são os responsáveis pela
nova forma do Estado e da sociedade, são os "funcionários da superestrutura", que terminam por moldar o
mundo à imagem e semelhança da classe fundamental.
Nessa linha de raciocínio, entendemos
que os gestores, produtores e demais integrantes da execução da programação
oficial do carnaval de São Luís, em 2016, sob a responsabilidade da Fundação
Municipal de Cultura e da Secretaria de Estado da Cultural, que mobilizem seus
intelectuais ativistas e façam a coisa fluir, pulsar e ficar compartilhada
entre os atores envolvidos. Assim se banirá a inercia e frieza que aqui foi
reclamada.
Queremos um carnaval comprometido com a
população e brilhando, onde nossa manifestação convocada a dar sua parcela de
contribuição possa desenvolver seu fazer cultural com satisfação e orgulho, sem
o casuísmo técnicos que deixe nebulosos o seu brilho, pois no carnaval como na
vida cotidiana, é como a purpurina, que indubitavelmente precisar brilhar para
a alegria popular.
* O
autor é Professor Mestre em Comunicação Social e Doutorando do Programa
Doutoral em Estudos Culturais na Universidade de Aveiro – Portugal.
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