AUSÊNCIA DO NEGRO NA PROGRAMAÇÃO DA TELEVISÃO

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AUSÊNCIA DO NEGRO NA PROGRAMAÇÃO DA TELEVISÃO

A ausência do negro na programação da televisão brasileira
Notamos que essa realidade está vinculada ao ideário de que o negro representa o feio, o maléfico ou incompetente.


por Lucas Ribeiro Novaes

A ausência do negro na programação da televisão brasileira é impressionante. É certo que este não é um dado novo, muito menos algo que tem chamado a atenção dos telespectadores mais assíduos. Contudo, penso que uma reflexão acerca do assunto, pode contribuir para entendermos melhor os fatores históricos que vem corroborando com essa discriminação. É obvio que não tenho a pretensão de dar cabo de tema tão complexo nas pouquíssimas linhas que se seguem, ainda sim, acredito que a coerência das ideias aqui expostas, possa lançar alguma luz nas leituras quase sempre deturpadas que são feitas sobre o assunto.



Para inicio de conversa, poderíamos citar a ausência do negro em outros espaços socialmente representativos. Dizer que apenas 2% dos alunos da USP são negros pode parecer tão espantoso quanto afirmar que menos de 2% dos médicos e pouco mais de 1% dos juristas deste país são afro-descendentes.
 Sendo um pouco mais persuasivo, indago o caro leitor: quantos advogados negros você conhece? Quantos grandes empresários? Arquitetos? Engenheiros? Psicólogos? Fisioterapeutas? Desculpe-me leitor, não era a minha intenção constrange-lo, mas precisamos concordar: só uma arguição mais empírica é capaz de tornar a nossa análise mais coerente, nos salvando, assim, do típico estereótipo do negro que vê racismo em tudo.
Em contraponto as indagações feitas no parágrafo anterior, pergunto agora: qual a raça/etnia predominante entre os nossos garis? Entre as nossas domésticas? Entre os trabalhadores dos chamados serviços gerais, que atuam no comércio e nas grandes fábricas? Qual a cor da pele de quem serve o cafezinho? De quem lava o chão? Por fim, não que isso tenha alguma relação, mas qual é mesmo a cor da pele da maioria das pessoas que compõe a população carcerária no Brasil? Como explicamos isso? Coincidência? Destino? Não. Isso tem outro nome. Mas qual é mesmo? Uma coisa é certa, o preconceito sempre foi útil para estabelecer e sustentar hierarquias, ainda sim, parece não ser suficiente, é preciso elaborar outros mecanismos simbólicos, que sirvam aos interesses daqueles que, por conveniência, defendem a segregação entre as raças.

Voltando ao tema central deste artigo, ou seja, a ausência do negro na programação da televisão brasileira, algo que pode ser facilmente constatado por qualquer pessoa. Notamos que essa realidade está vinculada ao ideário de que o negro representa o feio, o maléfico ou incompetente. No Brasil, o negro ainda aparece estigmatizado, depreciado, desumanizado, adjetivado pejorativamente, ligado a figuras demoníacas. Não obstante, é natural que sobre essa égide, não venhamos a ser considerados como modelos adequados para a indústria do marketing. É natural também que a única novela da história da teledramaturgia brasileira, que teve uma negra como protagonista, tinha o titulo de “Da Cor do Pecado” imputando aí, outro estigma: o da lascívia.

Na Novela “Viver Vida” de Manoel Carlos, Thais Araujo, a protagonista em questão, em uma sena vergonhosa, precisou demonstrar a sua submissão racial, ao pedir desculpas de joelhos após levar um tapa no rosto da personagem interpretada por Lilia Cabral. É inegável que volta e meia as novelas brasileiras de maior audiência e anúncios publicitários se tornam veículos de reprodução de valores racistas contra o negro brasileiro. Na novela Pátria Minha, da Rede Globo, escrita por Gilberto Braga, em outra cena patética, um dos personagens centrais da trama, ao desconfiar que o jardineiro negro de sua casa tivesse lhe roubado, desabafa: “negro safado”, “crioulo” “negro insolente”, e o que é pior, mostrou o negro como um ser incapaz de reagir às ofensas, como alguém que não tem consciência, ou auto-estima.

O fato é que a questão racial é representada como um problema ou uma doença dos negros, o que é, evidentemente, falso e ideológico. Nessa relação dual entre negros e brancos, ver-se um grupo como perdedor e o outro como vencedor. O silêncio suspeito de um grupo que pratica a violência étnico/racial e que dela se beneficia, seja simbólica ou concretamente, a estigmatização do outro. Mais recentemente, Boris Casoy, um dos mais bem pagos jornalistas desse país, destilou toda sua fúria contra um grupo de garis da cidade de São Paulo que tinham, educadamente, a convite de seu próprio jornal, desejado um feliz natal a todos os brasileiros.

Em outra oportunidade, a atriz global Daniele Suzuki, depois de fazer uma viagem a uma cidadezinha do interior do sul do Brasil, teceu o seguinte comentário no programa do Faustão: “Você precisar vê, o lugar é lindo! Tem muita gente bonita, todas branquinhas, mas também né... são na sua maioria descendentes de europeus”. Afirmando assim, a ideia do europeu que transformou o não europeu em um ser diferente, ameaçador ao outro. O preconceito passa a ser um sentimento e um pensamento de simplificação da complexidade que se manifesta no outro. Esses mecanismos silenciam as desigualdades dos direitos sociais, e iniciam uma exclusão perversa em âmbitos da vida social, como na escola, na família, na saúde, na cultura e nas relações sociais de onde derivam muitos dos sofrimentos experimentados individualmente.

Assim sendo, podemos afirmar que o ponto de vista que prevalece na imprensa brasileira é o ponto de vista de quem goza de poderes na sociedade atual, e culpabiliza a vitima da opressão. A verdade é que se retirarmos o som de nossa televisão, deixando apenas a exibição das imagens e convidarmos um telespectador inglês para assisti-la, ele ainda terá a nítida impressão que estará na Europa.

O espaço ocupado pelo negro na televisão do nosso país é tão ínfimo que chegar a ser difícil de notar. Ainda assim, todas as ações movidas pelos movimentos negros em repudio as posturas racistas da televisão brasileira, são tachadas de coercitivas à criatividade artística, como se o desrespeito e o racismo fossem mecanismo imprescindíveis para concepção de uma obra de arte.




Pois então... Se o negro é alijado dos espaços sociais mais representativos, por qual razão haveria de se fazer presente na programação da televisão brasileira? Esta parece ser uma questão de causa e consequência, não acha? Pense em todos os telejornais, nos programas de auditório, nos programas esportivos, nos de entrevistas e nos reality shows. Pense, sobretudo, nos comerciais que você já assistiu na vida e tente identificar quantos negros estavam presentes. Pense nos super-heróis dos desenhos animados, nas apresentadoras de programas infantis e em todos os demais segmentos da programação da televisão brasileira que você perceberá que o titulo deste artigo é tão óbvio que parece ser desnecessário.

- Por Lucas Ribeiro Novaes, estudante de psicologia do 8º semestre.
Coordenador Geral do GAPS – Grupo de Ação Psicossocial da Criança e do Adolescente.

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