A Condicao Mariel aborda o contexto da Revolucao Cubana

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A Condicao Mariel aborda o contexto da Revolucao Cubana

Livro, de autoria de Rickley Leandro Marques, editado pela Edufma, aborda alguns aspectos até então pouco explorados sobre a Revolução Cubana.

Roberto Mauro Gurgel Rocha
Especial para o Alternativo
15/09/2013 00h00

A análise dos fenômenos sociais e das grandes mudanças que ocorrem no seio da sociedade nos leva tanto à grande paixão pela narrativa ou à sua rejeição. Nós, os jovens militantes dos anos 1960 e 1970, ao falar da Revolução Cubana, tínhamos um brilho nos olhos e víamos alimentada a nossa esperança de, à sua semelhança, ter no Brasil uma sociedade mais justa animada pelos ideais do Socialismo, que muitas vezes não sabíamos definir bem do que se tratava, mas acreditávamos que nos levaria a um mundo novo onde reinavam a justiça social e o direito de todos. Víamos na imagem de Cuba em relação ao mundo capitalista (muito especialmente aos Estados Unidos da América) a imagem do combate entre Davi e Golias de que nos fala o texto bíblico.
Em nossa visão, o desejo de uma nova realidade conquistada pelos revolucionários cubanos nos estimulava a prosseguir pautados nos escritos e práticas de Che Guevara e Fidel Castro. Amadurecendo em nossas análises e práticas, juntamente com outros colegas da Universidade Federal do Maranhão e membros do movimento social, criamos nessa instituição da Educação Superior o Núcleo de Estudos da América Latina – NEAL. Os ventos do ideal bolivariano sopraram fortemente e, graças ao esforço de Ludmila Lago, Raimundo Palhano, Maria José Cardoso, Fabiana, Gilmário, Hipolito e eu, conseguimos criar um espaço latino americano de exposições no Palácio Cristo Rei, realizar Seminários, intercâmbios, chegando a publicar pelo menos um Caderno de Estudos. Foi um momento marcante que nos animou grandemente na década de 1990, quando tivemos um estímulo de políticos, cônsules e de embaixadores, criando canais de comunicação com a Argentina, o Uruguai, Costa Rica, México e Cuba principalmente. Com o apoio da Universidade Federal do Maranhão chegamos a publicar dois livros sobre a América Latina. Certamente nossos ideais por um mundo novo não morreram, mas, nossos novos engajamentos e mudanças ocorridas no panorama universitário da UFMA levaram a novos discernimentos...
Publicação - O lançamento do livro A Condição Mariel: Memórias Subterrâneas da Revolução Cubana, da autoria de Rickley Leandro Marques, foi, para nós, um momento de reflexão e amadurecimento. Não conheço pessoalmente o autor, mas quero parabenizar-lhe pela forma radical, mas sem extremismo, como trata em seu livro a história de um grupo socialmente excluído no avançar de um processo revolucionário, pela sua forma de pensar e agir, mesmo batalhando por ideais comuns. Na primeira parte do livro, Rickley narra com detalhes precisos e fiéis os grandes momentos da Revolução Cubana, mediante a análise de suas fases iniciadas a partir de 8 de janeiro de 1959 até o momento da aliança com os soviéticos como uma forma de sobrevivência ao bloqueio Norte-americano. O perfil do homem novo e sua construção mostram como se pensava um ser revolucionário e para tal, para atingir os seus padrões, criavam-se escolas de trabalhadores, eram feitos congressos, enfim, lutava-se pela nova Cuba, livre das teias do imperialismo. Mas, como em qualquer processo, surgem formas de pensar distintas, que são aceitas ou negadas pelo grupo hegemônico e, como narra o autor do livro, a partir do chamado caso Padilha – um intelectual reconhecido pelos seus escritos e passado a ser rejeitado pelos revolucionários, começa a surgir uma repressão aos que pensavam de outro modo, que cresce e chega ao seu extremo na ocupação significativa da Embaixada do Peru em Cuba. É aí que começa ser mais visível a luta dos discordantes e o aparecimento da Condição Mariel
A segunda parte do livro é dedicada ao fenômeno Mariel, ou para tratar seus membros como gente aos marielinos. E quem são eles? São intelectuais críticos lutando pela liberdade de pensar mais livre, são os homossexuais, principais atores sociais incômodos à situação revolucionária, que, como tal, eram identificados pelos revolucionários cubanos. A abertura do Porto de Mariel em Cuba para saída destes incômodos, certamente abriu uma nova esperança de vida aos marielinos, que, com todas as dificuldades, chegaram ao Porto de Cayo Hueso em Miami, nos Estados Unidos. Esperando serem bem recebidos, desde a chegada perceberam ser desagradável a sua presença e o restante desta parte do livro é a narrativa da via crucis desses seres humanos marcados pela condição de quererem ser diferentes. Rejeitados pelos cubanos em sua terra, passam a ser rejeitados pelos cubanos saídos nos primeiros momentos da Revolução principalmente por razões de ordem econômica. A própria sociedade norte-americana os vê com certo desdém.
Os marielinos são então vítimas de uma dolorosa exclusão, passando à condição de outsiders, defensores da cultura cubana no exílio sem grandes condições, chegando a ter como estratégia de sobrevivência uma revista cultural e a publicação de livros. É doloroso ver a forma de tratamento recebida pelos marielinos, mas é animadora a maneira como resistem, e, mesmo na condição de exclusão a que são submetidos, encontram meios para dar o seu grito.
O livro levou-me a uma profunda reflexão, ao repensar meus modos de pensar sobre o meu agir e de valorizar cada vez mais o valor da diversidade... Recomendo a quem quer ser cada vez mais impregnado pelos desejos de uma plena justiça social, que não deixe de ler o livro.
Roberto Mauro Gurgel Rocha
Professor aposentado da UFMA
(Ex-diretor do Núcleo de Estudos da América Latina - NEAL)

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