A salvação de um monumento

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A salvação de um monumento

Hoje é dia de...Joaquim Itapary


05/03/2015



 Há nove anos, portanto em 2005, ocupei este espaço para um protesto contra anunciado propósito de executarem-se obras no Palacete de Gentil Braga, monumento arquitetônico situado na esquina da Rua Grande com a Rua do Passeio, sem a aprovação do IPHAN. Hoje recebo a notícia da louvável iniciativa do Reitor Natalino Salgado (Mais uma, de tantas já por ele adotadas e executadas em favor da UFMA e do Maranhão!) de meter em obras aquele bem de extraordinário valor cultural, desta vez em obediência a criterioso projeto de restauro e adaptações chancelado por aquele Instituto.

Naquela ocasião escrevi parte do texto que creio valer a pena reproduzir, parcialmente:
“Casas, uma vez moradas, adquirem, de modo terminante e para o resto dos tempos, uma alma que as personaliza e distingue das demais construções não destinadas à moradia, em vila ou cidade qualquer. Desde quando habitadas, elas serão sempre ambientes de fatos, gestos, sentimentos, sons e silêncios humanos. Suas janelas e suas portas transpassam, para fora, esses sinais de humana existência ao mesmo tempo em que deixam entrar, encerram e guardam no mais recôndito de seus cômodos as circunstâncias do ambiente em que se situem. Talvez seja por isso que tanto se ouça de certas casas desertas dentro das quais se tem a nítida impressão de ouvir murmúrios e ruídos típicos de vida familiar ou de sentir presenças de pessoas cujas figuras de há muito se foram com seus peculiares odores e trejeitos. Cada casa, além de obra de engenho e arte, é, assim, vida pessoal ou social materializada.”
.........
“Parece-me mesmo que, todos nós, ao penetrarmos em qualquer casa abandonada, despovoada de viventes, somos automática e misteriosamente providos de um olfato apurada e uma aguda intuição, como arqueólogos peritos na escavação de galerias imateriais, para a descoberta de tantos sentimentos, angústias, tabus e códigos familiares e para desentranhar desejos, perceber temores, ouvir alegrias das paredes, dos assoalhos, da terra dos jardins, dos saguões, dos porões e dos telhados, distinguir rostos na galeria dos que por ali transitaram entre a sala e a cozinha, entre a alcova e o banheiro, conversaram à mesa do jantar, escamaram peixes, pilaram o arroz, arrastaram sandálias, correram às janelas para ver passarem as procissões ou se embalaram nas redes fazendo rangerem escápulas. Não sei como viveram os familiares que habitaram o belo e singular Palacete de Gentil Braga, ali no Canto da Viração, com seu duplo silhar de azulejos à entrada. Certamente, naquele belíssimo casarão há trabalho para arqueólogos de sentimentos de alta intuição e atilada percepção. Também sei que, além de tudo isso o que guarda uma casa, seja pequena ou grande morada, aquela onde hoje se acha instalado o DAC, da UFMA, é uma obra de arte em si mesma. Exibi-la bem, íntegra, original em tudo, até poderia ser o só papel daquele Departamento. Não precisava fazer mais nada. Porque uma obra de arquitetura daquela qualidade é digna de respeito e preservação na integralidade dos elementos que a distinguem e conferem singularidade. Igualmente a uma monumental escultura erigida no coração da cidade, o Palacete de Gentil Braga é, principalmente, incomparável obra arquitetônica contendo como elementos intrínsecos de alto valor estético os seus volumes, os seus planos geométricos, os seus vazios, as suas cores, seus ornamentos, espaços e materiais. Nada deve privar a observação compreensiva e a total leitura desses elementos na harmoniosa unicidade em que foram criados pelo artista que os concebeu e edificou. É uma das mais belas e insubstituíveis peças do nosso patrimônio imobiliário.”
Hoje, depois de praticamente concluir a restauração do prédio da Fábrica Santa Amélia, de modo perfeito e em obediência aos cânones técnicos e artísticos da ciência do restauro, o Reitor da Universidade Federal, Dr. Natalino Salgado, adota mais essa providência salvadora de um bem de inestimável valor para a Cultura maranhense. E, assim, inscreve o seu nome, de forma lapidar, nas páginas de honra dos Anais desta cidade tão bela quanto desamada dos governos.

jitapary@uol.com.br

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