Cultura popular no universo virtual do Bumba meu boi Touro Vianense
Em uma iniciativa
inédita, grupos de bumba meu boi da baixada se unem e criam um portal, por meio
do qual estreitam seus laços e instrumentalizam suas atividades
O grupo de Bumba meu
boi Touro Vianense, do povoado Boisiquara, município de Viana, na região dos
Lagos, na Baixada Maranhense, mantem, em seus ritmos, indumentárias e ritos,
manifestações culturais tradicionais que o diferenciam, em vários aspectos, dos
grandes e mais conhecidos grupos do Maranhão.
Para tentar resolver
entraves que estão atrapalhando a preservação dessa identidade e para ter
acesso a políticas culturais que ajudem a manter a brincadeira, o Boi Touro
Vianense e outros 33 grupos dos municípios de Viana, Cajari, Matinha e Penalva
estão se unindo em rede, por meio de um projeto da Fundação São Sebastião,
denominado Rede Cazumba.
É um Centro de
Referência Memória e Comunicação virtual, por meio do qual eles querem trocar
informações, abrir canais de guarda das manifestações e ter acesso a políticas
públicas e editais voltados para o setor de cultura. A proposta é inovadora. É
a primeira vez que grupos de bumba meu boi se reúnem para montar uma rede
virtual independente que abra espaço para incrementar as brincadeiras e ajudar
a preservar a memória e as identidades dos grupos.
O projeto está em fase
de elaboração, com viagens de pesquisadores da cultura popular, educadores
pelos municípios da região em busca de consolidar os conteúdos. A pesquisa
começou com a catalogação (localização, nome e organizadores) dos grupos. É um
trabalho amplo, que vai se estender por anos para que se construa um perfil
completo e detalhado de cada um dos 33 grupos, suas histórias, toadas,
calendário de festas e rituais.
O trabalho é realizado
por meio de projeto da Fundação São Sebastião, sediada no município de Viana,
com apoio do Prêmio Redes do Brasil (categoria Local), promovido pelo
Ministério da Cultura, em edital premiado em 2015. O lançamento da Rede Cazumba
será no dia 20 de janeiro de 2017, em Viana. A proposta é que seja também uma
fonte de pesquisa sobre os Bois da Baixada para pessoas de todo o mundo.
Os 34 grupos que vão
integrar a rede têm o sotaque da Baixada. As manifestações deles estão
diretamente ligadas ao cotidiano de suas comunidades de origem, localizadas nos
municípios de Viana, Cajari, Matinha, Penalva e Monção, sendo algumas situadas
em povoados que ainda enfrentam isolamento geográfico e virtual.
“O isolamento não vai
impedir a comunicação e funcionamento da Rede Cazumba, pois, mesmo com as
dificuldades de acesso a linhas de internet no interior do Maranhão, os grupos
já fincaram um marco dentro da rede virtual para terem acesso quando, for
possível, e para reivindicarem esse acesso das autoridades constituídas, a rede
é uma saída para garantir a visibilidade e a continuidade das festas”, explica
o artista visual Claudio Costa, que foi convidado pelos brincantes para
participar do projeto.
Narciso Barros, amo do
grupo Touro Viananense, traduz bem a satisfação com a iniciativa que cria a
rede virtual. Ele acha que os grupos estão agora tendo oportunidades de gozar
de mais independência e voz, o vai ajudar as brincadeiras. “O boi da região já
merecia há muito tempo, uma organização para defender seu patrimônio, agora a
rede vem cumprir esse papel”.
Construção do Centro
A Rede Cazumba -
Centro de Referência Memória e Comunicação agrega efeitos de um trabalho que
começou durante reuniões entre lideranças do bumba meu boi nas Semanas Cazumba,
realizadas de 2010 a 2014, um projeto da Fundação São Sebastião com apoio do
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Comissão
Maranhense do Folclore. O projeto, incentivou a construção de intervenções
voltadas para a preservação da cultura popular.
Convivendo há anos com
os brincantes, o artista visual Claudio Costa participa da construção do Centro
de Referência Memória e Comunicação. A meta, segundo ele, é instituir
estratégias que garantam a continuidade das singularidades das manifestações e
proporcionar aos grupos o conhecimento necessário para, eles próprios terem
acesso a mecanismos que garantam acesso a políticas públicas e editais voltado
para a área de cultura.
No Centro de
Referência Memória e Comunicação haverá espaço para depoimentos dos amos e
demais integrantes das brincantes. Serão incluídas imagens de toadas, rituais,
arte de bordados, personagens, máscaras, figurinos e adereços, instrumentos
musicais. É uma página somente com fazedores de boi. Entre os espaços, os de
programações, atividades realizadas, educação patrimonial, editais culturais abertos
etc. “Funcionará como antena de comunicação de editais, encontros,
festividades, datas de rituais, por conta de eles estarem isolados”, explicou
Claudio Costa.
Singularidades
Uma das questões em
debate entre os grupos envolve o isolamento de alguns grupos em povoados de
difícil acesso. Pode ser que o isolamento tenha ajudado os grupos a manterem
suas secularidades, mas, ao mesmo tempo, tudo indica que esse mesmo isolamento
esteja ameaçando a sobrevivência dessas manifestações culturais, que estão sentindo
falta de apoio para se manter e serem atrativos suficientes para chamar a
atenção de novas gerações que possam garantir a continuidade das atividades.
É consenso entre os
grupos que o trabalho de educativo é importante para incentivar os jovens a se
envolverem com as atividades dos grupos e para preparar crianças e jovens para
dar continuidade às brincadeiras. Nesta fase de preparação do Centro de
Referência Memória e Comunicação, que começou em setembro deste ano, foram
promovidas oficinas educativas e patrimoniais e viagens de pesquisa para
criação de conteúdo.
Muitos dos debates que
culminaram com a ideia de criação foram realizados por meio de outras
atividades educativas promovidas pela Fundação São Sebastião e parceiros, o que
inclui a realização de oficinas, palestras, treinamentos e cursos. Essa
formação ajudou os grupos a terem autonomia e iniciativa de criarem a Rede
Cazumba. Essas atividades incluíram a participação de pesquisadores como Jandir
Gonçalves, que há anos investiga a cultura popular no interior do Maranhão
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