Resgate da tradição do bumba meu boi de zabumba é premiado pelo Iphan
Festival Bumba Meu Boi de Zabumba
acontece todos os anos em São Luís, desde 1994; sotaque esteve em declínio nos
últimos anos e quase foi extinto
SÃO LUÍS - O Bumba
Meu Boi está entre as manifestações culturais populares mais difundidas do
país, com forte influência da cultura negra. A presença de elementos e rituais
de matriz africana estão presentes nos ritmos, nas vestimentas, nos
instrumentos. No entanto, muitas vezes há a negação da importância dos valores
ancestrais africanos, apesar de serem marcantes no processo de desenvolvimento
da cidadania brasileira. Observando esse grande risco à manifestação, o mestre
Basílio Durans criou o Festival Bumba Meu Boi de Zabumba que, desde 1994,
acontece todos os anos em São Luís. A proposta é resgatar as raízes do sotaque
Zabumba, que esteve em declínio nos últimos anos e quase foi extinto.
Todo
esse trabalho foi reconhecido e, este ano, é um dos vencedores da 29ª edição do
Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan), na Categoria
I – Iniciativas de excelência em técnicas de preservação e salvaguarda do
Patrimônio Cultural. Além de levar às ruas este saber popular e
estas tradições, o Festival procura fórmulas para transmitir o conhecimento com
foco, principalmente, nos jovens. A ideia é deixar sempre claro que o tráfico
de africanos para o Brasil, na condição de escravos, teve forte influência na
formação da cultura maranhense, principalmente na culinária, mas também na
linguagem e nas danças. O Bumba Meu Boi de Zabumba é uma das manifestações que
mais se destacam entre aquelas que preservaram a cultura trazida do continente
africano.
Mestre Basílio conta que, quando
criança ficou doente e sua avó fez uma promessa. Se ele ficasse curado passaria
a brincar o boi anualmente. E foi o que ele fez. “Aos dez anos de idade comecei
a brincar o boi e não parei mais”, relembra. Ele gostou tanto que, há 23 anos,
criou o Festival Bumba Meu Boi de Zabumba, que já faz parte do calendário
municipal e estadual de cultura, envolvendo cerca de 1,6 mil pessoas. “Nós
queremos incentivar os grupos existentes e a resgatar aqueles que foram
esquecidos”, afirma. Durante o festival as apresentações se prolongam pelas
ruas e vários grupos se revezam nas brincadeiras do boi na cidade de São Luís.
Para a preparação do Festival e
durante o ano o grupo realiza encontros mensais onde preparam as ações com
vistas a manter as formas tradicionais do sotaque, visando, também o
envolvimento das novas gerações com pesquisa e preservação da sua cultura. O
clube, local da reunião do grupo, se transformou em ponto de encontro de
cantadores de Bumba Meu Boi.
O Bumba Meu Boi de Zabumba
O Complexo Cultural do Bumba meu boi
do Maranhão foi registrado pelo Iphan, como Patrimônio Cultural Imaterial do
Brasil, em 2011. O Bumba Meu Boi é uma manifestação popular em homenagem a São
João, protetor dessa tradição. O sotaque zabumba tem a singularidade de manter
os saberes técnico originais, como a comédia, os personagens, o toque, os
cantos e as dança, além da tradicional indumentária, chapéus, franjas e fitas
coloridas. No início do século XX os grupos eram quase todos formados por
pessoas originárias da região de Guimarães, a noroeste de São Luís, depois das
baías de São Marcos e de Cumã. Boa parte de seus dirigentes migrou para a
capital, onde recebiam parentes e amigos, com quem faziam a festa conforme suas
tradições. Memórias locais indicam que foi nos arredores do bairro de Monte
Castelo que surgiram os primeiros bois de zabumba de São Luís, que deram origem
aos grupos que até hoje se mantêm na cidade. As cores vibrantes de um figurino
rico em adereços que brilha ao ritmo das zabumbas, do tambor-onça, de pandeiros
e maracás trazem de volta ao Brasil as raízes africanas.
Os sotaques mais conhecidos são
matraca, zabumba, orquestra, baixada e costa de mão. O sotaque de zabumba
caracteriza-se pela presença das próprias zabumbas, além de outros instrumentos
de percussão: tambor-de-fogo, tamborinho ou pandeirinho, tambor-onça, maracás e
apitos. Os brincantes dividem-se nos papéis de amos, índias, rajados,
vaqueiros, palhaços, pais Francisco, catirinas e outros cômicos, assim como o
próprio boi. Segundo a opinião corrente em São Luís, são os grupos desse
sotaque os mais apegados às tradições cômicas de representação do auto do boi e
de outras histórias sobre temas variados.
Grande parte dos brincantes é
socializada no boi desde a infância ou juventude, e assim se aprende a executar
atividades necessárias à sua manutenção, como cantar, tocar, dançar, bordar,
confeccionar instrumentos musicais ou, ainda a administrar e organizar o
conjunto. Além disso, a participação no grupo alimenta uma série de relações de
cunho profissional, familiar, afetivo, político, entre outros. Brincar o boi
significa não só compartilhar a dimensão lúdica e festiva, mas também cumprir
obrigações para com a realização dessa brincadeira. É por meio dela que, na
brincadeira, os humanos entrariam em contato com espíritos e outras entidades,
em experiências de prazer e obrigação ou sacrifício pessoal.
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