Um bilhão de motivos

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Um bilhão de motivos


Foto de Vias de Fato.

Jornal Vias de Fato - Agosto de 2015
No final do mês de julho, o meio político maranhense ficou agitado por conta de um artigo do deputado federal José Reinaldo Tavares (PSB-MA), publicado no Jornal Pequeno (21/07/15), onde ele propôs um “pacto pelo Maranhão”, numa articulação, “acima da política”, que uniria o governador Flávio Dino e o ex-senador José Sarney, para melhorar “a vida sofrida de nossa população”. O ex-governador diz que pretende “unir todos pelo desenvolvimento do Maranhão”, pois com todos juntos será “muito mais fácil e mais rápido mudar” a realidade do estado. No final do texto, ele pede a “reflexão de todos”.

           
É impossível levar o conteúdo desta proposta a sério. É lógico que ao falar de pacto, José Reinaldo não está preocupado com o “sofrimento do povo maranhense”. Ao propor este repentino flashback ele mandou um recado para a classe política, se reposicionou moderadamente dentro da conjuntura e sinalizou uma insatisfação em relação a Flávio Dino, o governador que ele ajudou a chegar ao poder. No meio dos discursos em torno da proposta, José Reinaldo deixou claro, desde já, antes das eleições municipais de 2016, que é pré-candidato ao Senado em 2018. E entre adulações e elogios ao atual governador, disse que o mesmo poderia “atender mais a classe política”. Resumindo, a ação do deputado faz parte da luta incessante por espaço no campo político e institucional (poder, orçamento), entre a capital e a província. E os que falam em “gesto histórico”, “projeto maior”, “proposta nobre”, “diálogo com adversários”, apenas fazem coro com a malandragem evidente. São ecos da picaretagem reinante.

Para nós, a importância desta movimentação de José Reinaldo (externada no texto publicado no Jornal Pequeno) é a possibilidade que ela nos oferece para analisarmos o baixo nível da classe política maranhense, seus interesses nebulosos, somado à incapacidade (e ao desinteresse) que toda esta turma tem de debater os verdadeiros problemas sociais maranhenses. Vamos, então, como sugeriu o comentado artigo do pacto, refletir e relembrar alguns fatos.

No início da década passada, entre os anos de 2003 e 2004, tornou-se público no Maranhão um desentendimento entre as senhoras Alexandra Tavares e Roseana Sarney Murad.  Alexandra, na época, era a primeira dama do Estado, esposa do então governador José Reinaldo, eleito pelo PFL. Roseana, a filha de José Sarney, era senadora pelo PFL e pré-candidata a voltar ao governo em 2006. Esta briga pessoal teve consequências políticas, provocando uma enorme crise no alto comando da oligarquia maranhense. Por conta da esposa, José Reinaldo surpreendentemente rompeu com Sarney, seu antigo padrinho.

(Registramos, ao fazer esta breve retrospectiva, que a miséria do Maranhão, suas causas e consequências, não foram, logicamente, a motivação para o rompimento. Os dramas da população entram depois, como discurso).

Aquela conhecida crise palaciana abriu um espaço considerável para os setores mais ou menos independentes da política local e para alguns poucos e autênticos adversários do oligarca e da oligarquia, um espaço político e também eleitoral. Em meio ao clima de ódio e ressentimento entre os ex-aliados, houve certa ampliação do debate público e a divulgação de novas e antigas denúncias contra os donos do poder no Maranhão. É nesta conjuntura que Jackson Lago se elege governador em 2006 e Flávio Dino em 2014. É neste período em que se amplia a desmoralização nacional de José Sarney, a ponto de ele ficar fora do jogo eleitoral de 2014, pois estava abatido pela opinião pública.

O atual deputado federal José Reinaldo, figura central da crise (hoje divorciado de Alexandra), tornou-se, desde 2006, um dos principais fiadores do projeto de poder de Flávio Dino, mantendo atualmente seu sobrinho, Marcelo Tavares, no cargo de Chefe da Casa Civil do governo do Estado. Apesar do cargo pomposo, é sabido por todos que o poder de Marcelo foi diminuído pelo governador Flávio Dino, ao longo do primeiro semestre, fato que evidentemente desagradou ao tio, lhe criando problemas para seus projetos futuros. Agora em julho, em meio ao rebuliço provocado pela “proposta de pacto” com Sarney, o governador Flávio Dino baixou a medida provisória nº 208 – publicada no Diário Oficial do dia 23 de julho – regulamentando “a estrutura administrativa do Estado do Maranhão”, onde a Casa Civil passará a “coordenar o programa de financiamento BNDES/ Estado do Maranhão”. Na prática, Marcelo Tavares vai administrar algo em torno de R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais).

Se onde tem fumaça tem fogo, o artigo de José Reinaldo foi a fumaça e essa montanha de dinheiro do BNDES está no meio da fogueira...

Vale lembrar, nestas reminiscências sobre a política maranhense, que em setembro do ano passado, dias antes da eleição que conduziu Flavio Dino ao Palácio dos Leões, um grupo de organizações sociais lançou um manifesto onde está dito: “É lógico que o Maranhão precisa de mudanças! Porém, é impossível falar em mudar esta trágica realidade, sem tratar de duas questões: o modelo de desenvolvimento econômico e a democratização do Estado”. O texto falou de um Maranhão com uma “economia assassina”, de um poder público “que age contra a sociedade” e de uma classe política que “com raras exceções”, “não é servidora pública, mas sim um bando, atuando para saquear o Estado”. Este documento; intitulado “Do Maranhão: um manifesto ao povo brasileiro”; repercutiu nas redes sociais e foi registrado em sites como Adital, Revista Fórum, Combate ao Racismo Ambiental e Brasil de Fato, tendo a assinatura, entre outras, da CPT, Cáritas, CIMI, MST, Vias de Fato, Moquibom, Fóruns e Redes de Defesa dos Direitos da Cidadania e CSP Conlutas.  Apesar da repercussão, a tradicional classe política maranhense calou diante da crítica. Não quis o debate.

Sobre estes “bandos” citados, que vagam pela política maranhense, o que prevalece são os ajuntamentos familiares que gravitam em torno do poder.  Esta “saga” de José Reinaldo, com as picuinhas e desavenças entre afilhados e afilhadas, os discursos de “libertação” e as cambalhotas em torno de pactos “acima (ou abaixo) da política”, revela o padrão da maioria dos atuais “homens públicos” do Maranhão. O patrimonialismo é a ideologia e a partir daí eles bajulam, agridem e até falam, cinicamente, das mazelas da população. Num passado recente, houve cólera recíproca e terríveis agressões e insultos envolvendo as relações de José Sarney com João Castelo, Epitácio Cafeteira e Ricardo Murad. Depois de um tempo – com novas eleições e velhos interesses – tudo se acomodou dentro da estrutura oligárquica do Estado. Registre-se que agora em julho, enquanto José Sarney escreveu artigos falando da lua, Sarney Filho foi a favor da proposta de pacto, deixando uma ponte com o antigo aliado do seu clã.

Ex-ministro dos Transportes do fatídico governo Sarney, José Reinaldo tornou-se vice-governador do Maranhão (na chapa de Roseana), em 1995, beneficiado por uma fraude feita dentro do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Maranhão, em 1994. Em 2002, Roseana renuncia para disputar o Senado e ele assume o governo, tendo Alexandra como principal aliada política. Um dos seus primeiros atos enquanto governador foi nomear Jorge Murad (marido e sócio de Roseana) como secretário de estado, para que o genro de Sarney não corresse o risco de ser preso, sob os ventos da Operação Lunus (lembram-se dela?). Seis meses depois desta nomeação, em outubro de 2002, José Reinaldo se reelege para o governo no primeiro turno, com menos de 50% dos votos exigidos pela Lei, em mais uma manobra feita com a ajuda da “Justiça” Eleitoral do Maranhão, sob o comando do “poderoso chefão” da grande máfia maranhense.

Como se percebe, o idealizador do novo “pacto pelo Maranhão”, já estava bem encaminhado para o lixo da história, quando rompeu com seu mentor, ajudando a impedir a volta de Roseana ao governo, em 2006. Ali, bem ali, independente das motivações, ele prestou um grande serviço à sociedade e à política maranhenses, abrindo novas possibilidades. Agora, sob o argumento de que quer “mudar o Maranhão”, ele aparece em uma cortina de fumaça sugerindo, resignado, chamar José Sarney e outros entulhos.

Ao povo maranhense, sugerimos que lembre Mário Quintana, quando ele diz que “todos estes que aí estão; atravancando o meu caminho; eles passarão...”.

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