Abaixo a chapinha

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Abaixo a chapinha


Defesa dos cabelos crespos naturais conquista cabeleireiros, com rede especializada no penteado, e ganha manifesto na internet

FELIPE SOUZADE SÃO PAULO
Sair de casa na chuva não é mais um problema para a recepcionista Gabriella Laurindo Ferreira, 19. Há cinco meses, ela aposentou a chapinha. Hoje, exibe nas ruas de São Paulo um cabelão volumoso e encaracolado.

"Minha mãe sempre usou cabelo enrolado, mas eu nunca achei que combinasse comigo. Um dia parei com essa ideia de que o bonito é só o liso. Então fui tratando até ele voltar a ficar natural", conta.


Ela lembra da vida de esticar os fios como um atraso. O maior incentivo para Gabriella cultivar os cachos partiu da blogueira Rayza Nicácio, 22, que se tornou referência no assunto. Com a intenção de ajudar as jovens a cuidar dos cabelos crespos, Rayza já acumula mais de 320 mil seguidores no Facebook.

"A maioria se identifica com a minha história. Muitas param de alisar o cabelo depois dos meus discursos. Eu peço para elas tentarem [deixar o cabelo natural] e mandarem os resultados para mim por fotos", diz Rayza.

BEM ARMADO

A auxiliar administrativa Vera Alda Dias dos Santos, 37, que abandonou o liso há um ano, vai duas vezes por mês ao cabeleireiro para cuidar dos cachos."Eu cuido e deixo bem armado. Ponho faixa, lenço. Tem gente que tem o cabelo liso, mas não tem essa beleza", diz Vera.

De olho nesse público, a presidente da rede Beleza Natural (especializada em cabelos cacheados), Leila Velez, quer aumentar de 29 para 120 o número de unidades no Brasil até 2018.

"Setenta por cento dos brasileiros têm cabelos que vão de ondulados a crespos. A gente quer aproveitar esse espaço", afirma.

A procura também aumentou em locais que já eram referência no penteado.
O cabeleireiro Celso Barbosa, 51, há 33 anos na galeria Presidente--referência da cultura afro no centro da capital paulista--, afirma que a tendência cresceu muito na última década.

"Percebi que o alisamento está sendo deixado de lado, e as mulheres estão valorizando o natural. Deve ser uma influência americana", diz.
Homens também acompanham a onda e retomam o tradicional "black power" dos anos 1950. Com um pente espetado na robusta cabeleira, o vendedor Kaio Augusto de Almeida Júlio, 22, diz que o corte representa atitude.

"É assim que o povo preto se identifica e tem que se assumir assim", conta ele. "Vários caras aparecem com cabelo alisado ou 'black power' com boné, se escondendo. Eu digo: 'Sai dessa e assume essa africanidade que você tem.'"
Para Almeida, as mulheres devem abusar dos cachos. "Tem meninas que ficam com chapinha por oito dias. O cabelo black dá mais ousadia."

PRECONCEITO

Para valorizar a cultura dos cachos, um grupo de amigas de Pernambuco criou a página "Faça amor, não faça chapinha", no Facebook. Uma das administradoras, Katarina Mendes, 19, diz que a intenção é mostrar que não é necessário seguir um padrão de beleza para ser feliz.

Para ela, muitas pessoas são influenciadas porque a sociedade tende a valorizar o que mais se aproxima da cultura branca. "Uma leitora nos disse que a irmã pequena estava sendo discriminada na escola por ter o cabelo crespo e as amigas não. Nossa intenção é levantar a autoestima de pessoas assim", diz.

POLÊMICA

Nesta semana, a apresentadora Giuliana Rancic, do programa americano "Fashion Police", pediu desculpas à atriz Zendaya Coleman após fazer piada sobre os dreadlocks usados por ela no Oscar. Giuliana disse que o penteado fazia Coleman parecer alguém que cheirava a maconha e óleo de patchouli.

No ano passado, a jornalista baiana Lília de Souza também protagonizou uma polêmica, desta vez no Brasil. Ao tirar foto para renovar seu passaporte, ela foi orientada a prender seu cabelo "black power", já que o sistema de imagens do documento não aceitava a fotografia.
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DIANA BRITODO RIO
Apesar de ter o cabelo "black power", a carioca Gabriela Monteiro, 26, diz não compactuar com o movimento antichapinha. "Sou a favor da liberdade de ser do jeito que se sentir melhor. Com ou sem chapinha, o importante é estar bem", diz ela.

Nascida e criada nas comunidades Chapéu Mangueira e Babilônia, no Leme (zona sul do Rio), Gabriela decidiu manter seu cabelo natural há cerca de seis anos.

"Assumi meu estilo não por uma atitude política, mas porque gosto do meu cabelo. Super apoio a valorização dos cabelos crespos ou cacheados", conta ela. "Acredito que arrumava o cabelo antes porque nunca tive uma mulher negra famosa por perto como referência", completa.

No segundo semestre do ano passado, a jovem denunciou por racismo duas professoras do curso de Design de Moda da PUC-Rio.

Segundo a estudante, na época uma professora contou em sala de aula que estava no cinema quando apareceu uma menina "inconveniente" com o cabelo igual ao de Gabriela e sentou na sua frente dificultando a visão. Já a outra docente perguntou se o signo de Gabriela era leão quando ela entrou em sala de aula com o cabelo solto.
As professoras, que não foram encontradas pela reportagem, devem ser ouvidas pela polícia sobre o caso em abril. A delegacia registrou a queixa como injúria.




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