Catulo da Paixão Cearense

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Catulo da Paixão Cearense

Catulo

 

Hoje é dia de...Jomar Moraes
 
08/10/2014

Num dia tão 8 de outubro quanto hoje o é, porém do ano de 1863, nascia nesta cidade, num sobrado revestido de azulejos, nº 31, que não mais existe, porque puseram-no abaixo, para em seu lugar construir o imóvel que presentemente ali se vê, sob número 66, repito: nascia a importante personalidade de quem nesta crônica me ocuparei, por motivo de sua inegável importância e igualmente por sugestão de sua data natalícia. Iniciativa, creio eu, que contribuirá, embora em proporções muito modestas, para fazer lembrados o nome e os feitos desse maranhense realmente ilustre que anda bastante esquecidinho por estas plagas.

Filho de um ouvires cujo inusitado nome transformou um topônimo em antropônimo, transmitindo-o parcialmente ao filho, ele ainda muito cedo partiu daqui com sua família, toda ela coberta por um constrangedor e rumoroso labéu. Nosso herói sofre, de alguns desinformados, a pecha de ingrato e, mais que isso, orgulhoso e indiferente ao Maranhão.


A verdade dos fatos, porém, é muito outra. Esse maranhense, apesar de um tanto ou quanto orgulhoso de si, pelas muitas razões que tinha para sê-lo, cultivava, no imo de seu ser, grande e sopitada afeição por sua terra natal. Aconteceu, entretanto, que bem maior que tal sentimento, era a vergonha que por toda a vida o torturou.

E logo declinarei o nome por completo de quem estou falando e que a esta altura é um mero segredo de polichinelo, pois os que eventualmente me estejam honrando com a leitura deste dedo de prosa, já sabem que meu assunto, até aqui supostamente velado, não é outro senão Catulo da Paixão Cearense.

A óbvia conclusão não poderia ser diversa, em razão, entre outras, do título que acima se lê. Catulo, igualmente foi o título que em seu livro “Vivos e mortos” o lúcido crítico e grande sarcasta Agripino Grieco deu ao capítulo em que aprecia, panoramicamente embora, a obra do poeta romano Caius Valerius Catullus, que viveu antes de Cristo, e que segundo a abalizada opinião de mestre Otto Maria Capeaux, foi, comparado a seus contemporâneos, “o mais velho entre eles, e o maior”. E na continuidade de sua apreciação, acrescenta Carpeaux (“História da literatura ocidental”, 1º volume): “Catulo é, no primeiro século antes da nossa era, um poeta moderno. E, entre os poetas, o primeiro que se comove com a paisagem”, sendo além, disso um elegíaco somente comparável, entre os romanos, aos momentos culminantes do gênero, pois que autor de versos quais os de sua Elegia I, que só encontram parelha em Virgílio.

Segundo ia eu dizendo, Agripino Grieco, em seu livro “Vivos e mortos” urde o capítulo Catulo com tal maestria, que consegue dissimular, com engenhosas generalidades, o poeta de quem se ocupa, já que começa afirmando: “Catulo, eis, sem dúvida, o maior poeta de seu tempo.”

É bem verdade que assertivo tão contundente leva a procedentes desconfianças. Mas estas podem perfeitamente ser lançadas à conta de um exagero de apreciação. E nesse tom prossegue o admirável sarcasta, e leva a bom termo, seu curioso exercício de prestidigitação verbal para, no último parágrafo, esclarecer que trata do poeta romano amigo de Cícero e amante Clódia, e não do brasileiro cantor dos sertanejos, das vaquejadas, do marroeiro e do luar do sertão.

Essa foi uma das conhecidas tiradas de espírito do velho Grieco, que, porém, no livro “Evolução da poesia brasileira” dedica a seção VI, denominada Regionalismo, e inteiramente a Catulo da Paixão Cearense. Inicia com um reconhecimento ao poeta, nestes termos: “Ninguém mais estimável que o Catulo da Paixão Cearense.” 

Mas logo a seguir faz-lhe procedentes restrições, apontando o sensível declínio de seu prestígio, aferido em razão do cada vez menor interesse do público por suas obras.
E logo depois bate forte no conhecido ponto fraco do autor de “Evangelho das aves”: seu desmedido, seu gilberteano orgulho. O adjetivo gilberteano, cunhei-o em memória do sesquipedal orgulho de si mesmos que tinham e não faziam nenhum segredo, Gilberto Freyre e Gilberto Amado. O primeiro, diga-se de passagem, com muito mais razão do que o segundo.

Assim Grieco começa a falar no orgulho gilberteano de Catulo; logo após dizer que foi ele, no “Meu sertão, um magnífico poeta.”

“Pena é que seja tão vaidoso, de uma vaidade hipertrófica, exorbitante, e pretenda impor aos brasileiros em geral a catulice, ou seja – a religião de Catulo”, e por aí vai. 

Creio que por conta do que sempre se falou do Catulo excessivamente orgulhoso de si, disseminou-se no Maranhão a ideia de que ele tinha desprezo por sua terra natal. Acredito, porém, que o distanciamento que ele sempre manteve relativamente ao Maranhão, não se devia a orgulho, mas a constrangimento, por motivo de seu pai, o cearense Amâncio José da Paixão Cearense, amigo e compadre do desembargador Pontes Visgueiro, haver sido compelido por este a soldar o caixão em que foram depositados os restos mortais da infeliz Marinhinhas. E esse crime repulsivo e rumoroso terminou envolvendo o ouvires Amâncio, que teve de evadir-se de São Luís com sua família. Natural que o constrangedor episódio “fechasse” as portas de São Luís para o poeta famoso que, porém, não deixara de filho de Amâncio.

A propósito: guardo com muito zelo, presente de saudoso cunhado Areli Leitão, o exemplar nº 1 da tiragem fora do comércio, em papel especial, dos “Poemas escolhidos” de Catulo da Paixão Cearense, seleção e organização de Guimarães Martins, com 17 caricaturas do poeta por diversos artistas, a esta dedicatória do próprio punho do poeta: “Ao Guimarães Martins, amigo dileto, conterrâneo ilustre, que com o seu talento e energia moral tem enriquecido o Maranhão, relembrando as glórias de seus filhos, como Apolônia Pinto, Inácio Raposo e outros mais. Estes “Poemas escolhidos”, selecionados por ele, pertencem-lhe de coração. E de coração lhe ofereço este exemplar de luxo, número 1, onde verá em primeiro lugar o seu nome, na dedicatória. Catulo – Rio, 12.11.1944.”

O volume, de 400 páginas, foi editado em 1944, por Zélio Valverde. E Catulo faleceu a 10 de maio de 1945.

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