ZE INALDO, O COMANDANTE DO BATALHAO DA MAIOBA
"O que me completa é sem dúvida o Boi da Maioba"
Filho de um dos fundadores do Boi da Maioba, José Inaldo sempre esteve envolvido com a manifestação, mas precisou superar a dor da morte do pai.
Mario Carvalho
Da equipe de O Estado- Caderno DOM
Da equipe de O Estado- Caderno DOM
29/06/2014
No período junino, o técnico em contabilidade, caminhoneiro e corretor de imóveis José Inaldo Ferreira, de 59 anos, deixa de lado seus afazeres profissionais para se dedicar de corpo e alma às manifestações artísticas do Boi da Maioba, considerado um dos grupos mais populares da cultura maranhense, cuja tradição já perdura por 117 anos e vem passando de pai para filho. Desde 1994, José Inaldo também carrega nos ombros a difícil missão de conduzir as diretrizes da brincadeira na função de presidente da Associação Folclórica Beneficente Bumba-Boi da Maioba, que nos últimos anos tem assumido a condição de profissionalizar a atividade e transformá-la num produto da indústria cultural para comercialização tanto no mercado interno quanto externo.
José Inaldo nasceu no dia 20 de agosto de 1954, na comunidade rural da Maioba, localizada no município de Paço do Lumiar, e cuja área está encravada na Região Metropolitana da Ilha de São Luís. Segundo ele, a localidade traz uma forte herança cultural que o ajudou a se transformar num dos amantes e ativistas do bumba meu boi. Logo nos primeiros anos da infância vividos na comunidade, travou contato com as manifestações artísticas do Boi da Maioba ao lado do pai, José Raimundo Ferreira, e da mãe, Cremilda Inácia Ferreira.
Inaldo teve uma infância simples, onde pôde desfrutar de bons momentos passados junto à comunidade maiobeira, cuja área verde, ainda com poucos loteamentos, revelava toda a exuberância dos rios, riachos e das árvores frutíferas que saciavam a sede e deixavam à disposição alimentos naturais diversos. "Tínhamos o contato com as águas cristalinas do Rio Paciência e frutas em abundância que acabavam estragando de tanta fartura. Graças a Deus, tive a dádiva de ser maiobeiro da gema", diz.
A infância se confundia com a própria Maioba, onde pôde também participar de brincadeiras que hoje não são mais comuns. "Pude naquela época brincar de carrinho, bola de gude, jogar chuço, castanha, peão, enfim, aquela coisa que toda criança gosta e que na oportunidade, eram brinquedos de todos nós", comenta com certo ar de emoção na fala.
Mudanças - A partir dos 8 anos de idade, José Inaldo começou a frequentar a escola e, pela dificuldade de acesso e transporte no local, teve que morar no bairro do João Paulo, deixando de conviver na Maioba durante a semana, passando a fazê-lo somente nos fins de semana. "Uma irmã do meu pai que morava no João Paulo me abrigou para que eu pudesse frequentar a escola. Mesmo vindo à Maioba nos fins de semana, sempre estive engajado com a minha comunidade e no convívio com meus amigos de infância", frisa.
Ao completar os 19 anos, concluiu o antigo Segundo Grau na Academia do Comércio, onde se formou em Técnico em Contabilidade. "Aos 21 anos, meu pai me mandou para uma casa de outra irmã dele, no Rio de Janeiro, pelos idos de 1976, onde fiquei até 1981. Mas nesse transcurso eu já participava do Bumba-Boi da Maioba, pois passava minhas férias aqui, no período junino. Eu costumo dizer para os amigos e para os mais jovens que fui o contínuo da brincadeira para chegar hoje à presidência da Associação Folclórica do Boi da Maioba, após o falecimento do meu pai em 1994, que presidia a entidade", ressalta.
Herança - Ele lembrou que, ao retornar do Rio de Janeiro, com um bom dinheiro na bagagem, oriundo da indenização do serviço que prestava, resolveu investir na brincadeira da comunidade como sendo uma promessa religiosa. "Já em 1981, quem organizou o Boi da Maioba fui eu. Além de toda uma equipe composta pelo meu pai e o João de Chita, que fazia parte do boi. Então, convidei meu primo e compadre Papera para participar da festança. Nesse ano, me envolvi diretamente com a agremiação e fiquei apaixonado pela brincadeira, chegando na época a fazer algumas composições com o então cantador do boi, João Chiador [que hoje se encontra no Boi de São José de Ribamar]", conta.
A partir daí, deu início a toda uma trajetória de sucesso do Boi da Maioba. "Em 1986, meu pai e meu padrinho João me chamaram e me entregaram a responsabilidade pela brincadeira. No primeiro momento, fiquei assustado, pois os dois disseram que já estavam velhos e cansados para dar continuidade à festança. Foi uma responsabilidade enorme, mas continuamos desenvolvendo um trabalho em equipe", enfatiza.
Por volta do ano de 1988, José Inaldo teve a ideia de criar a Associação Folclórica Beneficente Bumba-Boi da Maioba. "Naquele ano, reuni a comunidade e formamos uma grande assembleia e aí a gente constituiu a Associação Folclórica Beneficente Boi da Maioba, mas precisamente no dia 11 de outubro de 1988. Inicialmente, deixei meu pai como presidente da entidade, mesmo sem ele querer. Fiquei apenas ajudando a associação e desenvolvendo as tarefas e assim surgiu a Associação", relata.
Em 1994, José Inaldo teve o momento mais difícil de sua vida com o falecimento do seu pai, José Raimundo Ferreira. "Somente a partir daí, assumi o comando da brincadeira e estou até hoje aqui nessa luta árdua e trabalhosa. Acima de tudo, uma tarefa cansativa e muito desgastante, mas prazerosa e o que me completa é sem dúvida o Boi da Maioba", garante.
Em família - José Inaldo Ferreira casou-se em 1982 com sua hoje ex-esposa Renilde, de cuja relação matrimonial nasceram o casal de filhos: Cecilene e Paulo Roberto Ferreira . "Apesar disso, hoje não tenho mais essa convivência familiar, mas vivo amigavelmente com essa parte de minha família. Paralelo a isso, tenho outros filhos. Um deles faleceu recentemente, que é o Cláudio. Tenho a Nádia, José Raimundo, Herlane, Bruno e mais recente a minha pupila, a Maria Clara", diz.
Fora do circuito das manifestações culturais, José Inaldo atua como técnico em contabilidade e corretor de imóveis, já tendo também se aventurado na estrada como caminhoneiro e até mesmo como dono de radiola de reggae, tocando em festas. "Apesar disso, sempre estive envolvido com a questão de eventos, acredito que tenho uma experiência muito grande nesse ramo. Hoje, trabalho como corretor de imóveis", pontua.
José Inaldo não almeja ser um cidadão rico financeiramente, mas apenas ser rico da graça de Deus e desfrutar de boa saúde e ter disposição para trabalhar pela família e garantir o sustento e o pão de cada dia. "Quero apenas conduzir a minha vida de uma forma normal, sem ter a necessidade de pedir nada a ninguém", enfatiza.
Atrás da profissionalização do boi
De 1994 até os dias atuais, José Inaldo Ferreira vem buscando a profissionalização artística do Boi da Maioba. Ele diz que a tarefa não é uma das mais fáceis no cenário cultural, mas que continuará nessa luta incessante. "A gente vem enfrentando barreiras para poder dotar a brincadeira de uma estrutura melhor. A infraestrutura física, graças a Deus e ao apoio do Governo do Estado, tem nos dado essa sustentação. Mas eu não fui atrás, mas esse apoio veio atrás de mim, o que sou muito grato em nome da comunidade da Maioba", ressalta.
José Inaldo lembra que com o falecimento do seu pai e a saída do cantador João Chiador, havia o medo que o Boi da Maioba desaparecesse do cenário folclórico do Maranhão. "Tive que mostrar para a sociedade e à comunidade da Maioba que sabia dar continuidade à festa. Disse comigo mesmo que iria mostrar para o nosso povo que a Maioba não ia cair. Com a saída de Chiador, o atual cantador, Chagas, já estava conosco e então resolvemos investir nele. Eu sabia que, se não desse certo com o Chagas, não daria mais certo com ninguém", diz.
Chagas era uma cria da Maioba e, portanto, tornava-se mais fácil trabalhar com ele para ser o ator principal. Porém, os primeiros ensaios com o novo cantador foram fracos e foi necessário buscar uma inspiração divina para salvar a brincadeira da comunidade. "O primeiro momento de Chagas no Boi da Maioba ocorreu justamente com o lançamento de Chiador no Boi de São José de Ribamar. A própria comunidade da Maioba foi para lá. Isso foi horrível, pois levaram todo meu povo para Ribamar. Então, fui para casa e não dormi", relata.
No mesmo dia de madrugada, José Inaldo saiu do terreiro, viu a lua, conversou com sua "espiritualidade". Devoto de Deus e São João, pediu que houvesse uma luz para reverter o quadro. "Resolvi, então, utilizar o espaço do restaurante do meu compadre Agenor, no Aterro do Bacanga, para fazer um grande evento, tirando a apresentação do Boi da Maioba da comunidade para outra área em São Luís. De imediato, a ideia sofreu represália da própria comunidade que não aceitava a proposta", relembra.
Para divulgar a ideia, José Inaldo contou com alguns amigos da imprensa e da mídia, como o jornalista José Raimundo Rodrigues e os radialistas Tony Duarte e Concita Castro, que o ajudaram a concretizar a proposta inovadora. "Apesar dos bombardeios, o sucesso veio e foi uma grande festa com a presença de um grande público que superou as expectativas, e assim tem sido até hoje onde o Boi da Maioba se apresenta", diz.
RAIO-X
NOME COMPLETO
José Inaldo Ferreira
IDADE:
59 anos
NATURAL:
Paço do Lumiar (Maioba)
PAIS:
José Raimundo Ferreira e Cremilda Inácia Ferreira
PROFISSÃO:
Técnico em contabilidade, corretor de Imóveis e promotor de eventos
SONHO:
Ser rico da graça de Deus
QUALIDADE:
Dignidade, honestidade e respeito ao próximo
VOCAÇÃO:
Ser um amante do Boi da Maioba
SAUDADE:
Dos pais
PERSEVERANÇA:
Ter dado continuidade ao trabalho no Boi da maioba
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