Opinião sobre "Bolsa-Família" leva Estadão a demitir colunista Maria Rita Kehl
Por Paula Franco/Redação Portal IMPRENSA
*Atualizado às 13h36
Em entrevista ao jornalista Bob Fernandes, do Terra Magazine, a psicanalista e colunista do jornal O Estado de S. Paulo Maria Rita Kehl confirmou sua demissão do veículo paulista. No último sábado (02), Maria havia escrito o artigo "Dois Pesos...", que falava sobre a "desqualificação" dos votos dos pobres e elogiava o programa Bolsa-Família, gerando grande repercussão na internet.
A colunista informou que foi notificada sobre sua saída do Estadão na última quarta-feira (06), e que a situação iria contra a defesa de liberdade de expressão feita pelo jornal: "Como é que um jornal que está, que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?"
Segundo Maria, o motivo de sua demissão foi o fato de o jornal ter considerado o texto um "'delito' de opinião": "O argumento é que eles estavam examinando o comportamento, as reações ao que escrevi e escrevia, e que, por causa da repercussão (na internet), a situação se tornou intolerável, insustentável, não me lembro bem que expressão usaram", declarou.
A ex-colaboradora do Estadão disse, ainda, que a repercussão gerada pelo seu artigo mostrava que há uma discussão entre os leitores que gostaram ou não de seu texto: "Eu disse que a repercussão mostrava, revelava que, se tinha quem não gostasse do que escrevo, tinha também quem goste. Se tem leitores que são desfavoráveis, tem leitores que são a favor, o que é bom, saudável..."
Para ela, em um momento em que a imprensa crítica os ataques feitos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra os veículos de comunicação do país, o fato de ter sido demitida seria uma situação absurda: "É tudo tão absurdo... a imprensa que reclama, que alega ter o governo intenções de censura, de autoritarismo", declarou a psicanalista, que disse não concordar com os rumores de ações concretas "para cercear a imprensa".
"Por outro lado a imprensa que tem seus interesses econômicos, partidários, demite alguém, demite a mim, pelo que considera um "delito" de opinião", criticou. Na entrevista, Maria disse acreditar que, devido período de eleições, a repercussão gerada pelo artigo tenha se agravado, "pois, pelo que eles me alegaram agora, já havia descontentamento com minhas análises, minhas opiniões políticas".
A coluna da psicanalista era publicada aos sábados no caderno "C2+Música". Um dos trechos do texto polêmico elogiava o fato de o Estadão ter assumido seu apoio ao presidenciável José Serra (PSDB) e falava sobre a briga pelo eleitorado: "Se o povão das chamadas classes D e E - os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil - tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos."
Enquanto ainda não se confirmava a demissão da colunista, o caso foi um dos assuntos mais comentados no Twitter nesta semana. O jornalista Xico Sá, que assina uma coluna na Folha de S.Paulo, escreveu em seu perfil no microblog: "Maria Rita Kehl seria a 1ª demissão da história por ter elogiado a atitude de 1 jornal." Sá declarou, ainda, que a publicação exigia que ela não escrevesse sobre política, "só psicanálise".
Ao Portal IMPRENSA, o diretor de conteúdo do Estadão, Ricardo Gandour, declarou: "O projeto original, no caderno "C2+Música", é ter aos sábados um espaço para a psicanálise, mas não era o enfoque que se vinha praticando. Assim, iniciou-se com a autora uma discussão em torno de novos rumos para a coluna, inclusive com a substituição da colunista, o que é normal numa publicação."
Gandour disse, ainda, que a repercussão do assunto na internet "precipitou a decisão, o que lamentamos", e que em nenhum momento houve censura: "A hipótese de 'censura' é incabível. Todas as colunas foram integralmente publicadas, como sempre serão", disse o diretor.
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