Decadência, poluição e fuga de frequentadores marcam praia do Olho d’ Água

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Decadência, poluição e fuga de frequentadores marcam praia do Olho d’ Água


THIAGO BASTOS / O ESTADO DO MARANHÃO 
Em pouco mais de quatro décadas, local virou símbolo da decadência; esgoto transborda no acesso à praia, e hoje poucas pessoas ainda se dirigem a ela para se divertir, mesmo com a falta de condições
Em pouco mais de quatro décadas, a praia do Olho d’Água - antes tida como o pedaço de areia mais belo da Ilha e procurado por milhares de banhistas nos fins de semana - virou uma área de decadência e poluição. Medidas, como a restrição na limitação dos veículos na faixa de areia, além da insegurança e ausência de condições para o uso do mar, geraram uma evasão de frequentadores, o que trouxe como consequência o fechamento de estabelecimentos.

O primeiro fator apontado por donos de bares mais antigos da praia do Olho d’Água e que gerou o sumiço dos consumidores foi uma Portaria (número 003), de origem municipal, que determinou que somente os bombeiros e proprietários de casas à beira-mar poderiam acessar a faixa de areia. A medida começou a ser aplicada em abril de 2012 e seguiu determinação da Justiça Federal, que acatou Ação Civil Pública elaborada pelo Ministério Público Federal (MPF).
Desde então, de acordo com donos dos estabelecimentos, o movimento de clientes é decrescente. “Muitos bares não aguentaram e decidiram fechar, pois ficou inviável aos clientes entrarem por aqui, e alguns estabelecimentos mais distantes do acesso à praia perderam freguesia”, disse Rodrigo Ferreira, dono do Bar Flor do Mar e criado na praia do Olho d’Água.
Ele se lembra do fluxo de banhistas na praia, há alguns anos, e da diminuição no número de clientes. “Aqui, nos fins de semana, era lotado. Vinha muita gente, mas agora é a coisa mais difícil você ver a praia cheia, mesmo em feriados e fins de semana”, afirmou.

De acordo com o proprietário, era necessário maior investimento do poder público para que a praia do Olho d’Água voltasse aos “velhos tempos”. “Era preciso ter mais estabelecimentos aqui e mais atrações, para que as pessoas pudessem vir para cá”, disse.
Primeiros frequentadores: segregação entre “ricos” e “pobres”

Os primeiros moradores do entorno da praia do Olho d’Água começaram a surgir em meados das décadas de 1940 e 1950. Alguns historiadores defendem a tese de que uma colônia de pescadores começou a popularizar a faixa de areia na Região Metropolitana. Apesar de ser uma das praias até hoje mais distantes dos bairros populares da cidade, a praia do Olho d’Água era frequentada (com a melhora dos acessos até ela) basicamente, nos primeiros anos, por abnegados e pessoas com bom poder aquisitivo.
Banhistas desta época lembram, por exemplo, que a praia era segregada entre os ricos, que se concentravam em determinados bares, e pessoas mais humildes, que conseguiam acessar a praia. “Havia essa separação, e quem ficava do lado mais pobre não conseguia ou nem tentava ir para o lado das pessoas mais ricas”, disse Antônio Lobato, um autodidata que vive em São Luís há várias décadas.
Os mais ricos acessavam a orla, em meados das décadas de 1970 e 1980, com seus carrões e se concentravam na praia de Iemanjá, inserida na área macro da praia do Olho d’Água. O Estado, a partir dos arquivos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), teve acesso a um acervo de fotos da antiga praia do Olho d´Água. Em algumas reproduções, é possível ver vários carros, um ao lado do outro, enquanto outras pessoas sem tantas condições financeiras entravam na faixa de areia a pé.
Poluição e insegurança
afastaram banhistas
Outro fator, além de possíveis ações criminosas e irregularidades na ocupação do espaço público, que acarretaram na decadência da praia do Olho d’Água, é a poluição. Levantamento feito por O Estado e com base nos relatórios divulgados este ano pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) mostram que em 2018 a praia do Olho d’Água esteve integralmente poluída. Apenas no laudo divulgado do dia 11 de janeiro de 2018, os dois trechos analisados da praia do Olho d’Água estiveram liberados para banho. Nos demais documentos, esta parte da orla da cidade registrou “coliformes fecais” acima do normal.
Um dos fatores para a elevação dos índices de poluição nas águas do Olho d’Água estaria no desenvolvimento da cidade. Com o surgimento de inúmeros empreendimentos no entorno do acesso à praia e de bairros com novos moradores, os resíduos produzidos por estes contingentes começaram a desaguar abertamente no mar, an­tes usado por banhistas. Se o fluxo de resíduos elevou consideravelmente, o mesmo não ocorreu em relação aos investimentos do poder público para o reaproveitamento do esgoto.
Outro fator responsável pelo lançamento de dejetos no mar é o conjunto dos estabelecimentos do entorno. Sem a estrutura sanitária necessária, os resíduos produzidos pelos bares e restaurantes foram jogados ao longo dos anos nas águas marítimas, o que levou a proibição para o uso do trecho para banho.
O Estado esteve na praia esta semana e constatou que grande quantidade de esgoto ainda é lançado no mar. Sem tratamento, os resíduos inapropriados se misturam aos olhos d’água ali existentes e contaminam o mar, conforme estabelecem as regras do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
Para ser considerada imprópria - com base na Resoluçaõ número 274 do Conama, para ser considerada “imprópria”, o trecho deve conter um valor superior a 2.00 coliformes fecais por 100 mililitros de água. A divulgação obrigatória e semanal dos laudos de balneabilidade pela Sema e que atestam a má qualidade da praia do Olho d’Água ocorreu após decisão judicial, gerada após intervenção da Promotoria do Meio Ambiente. Na ocasião, o MP alegou que a realização dos testes era uma situação de “saúde pública” e que, portanto, deveria ser priorizada.
SAIBA MAIS
Questionado sobre o esgoto que jorra no Olho d’Água e balneabilidade na área, o Governo do Estado enviou nota genérica, que não explicou o assunto. “A Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) informa que desenvolve ações para aumentar de 4% para 70% o índice de esgoto tratado em São Luís. Para tanto, está instalando 355 km de rede coletora de esgoto e interceptores, construindo novas Estações Elevatórias de Esgoto e duas novas ETEs (Vinhais, já entregue e Anil, em construção), que se somam às duas já existentes para tratamento de esgoto na capital. As iniciativas implicam na melhoria da balneabilidade da orla.”
LAMENTO
Se a praia do Olho d’Água, há algumas décadas, era sucesso de público, atualmente não se assemelha ao que já foi um dia. A decadência se reflete na ausência de frequentadores no trecho no período de férias e fins de semana. É comum ver trechos da praia vazios. Os poucos que ainda se arriscam a visitar a praia reconhecem a mudança. “Há alguns anos, era muita gente que vinha aqui. Hoje pouca gente se arrisca. Eu ainda venho porque conheço os donos de bares, mas só por isso”, disse o técnico de enfermagem Emílio Barros.

Fiscalização e queda de bares

Em 2016, uma força-tarefa comandada pelo Ministério Público Estadual (MPE) resultou na demolição de vários bares fixados na praia do Olho d´Água. O trabalho contou com o apoio da Blitz Urbana, da Prefeitura de São Luís, e foi um marco para o início da derrocada da praia do Olho d´Água. Desde 2009, donos de bares vinham sendo notificados acerca da possibilidade de queda das estruturas, sob a alegação de várias irregularidades. Além de alegar que os bares ocupavam espaços mantidos pela União, o MP argumentou ainda que eram em alguns destes estabelecimentos que aconteciam determinadas práticas criminosas, como prostituição infantil e venda de bebidas alcoólicas para menores de idade. Após essa operação, nenhum outro bar surgiu na área do Olho d´Água.

Aniversário do esgoto
O esgoto, que faz parte atualmente do “cartão-postal” da praia do Olho d’Água e está situado em um dos acessos à orla, existe há mais de duas décadas. Em novembro de 2014, O Estado registrou a ação irônica dos moradores adjacentes, frequentadores e de surfistas, que fizeram um bolo para comemorar os 20 anos do esgoto. O ato teve vários fatos interessantes, entre eles a oferta do primeiro pedaço de bolo para o próprio esgoto. O Estado voltou ao local na sexta-feira (3) e verificou que o esgoto permanece no mesmo ponto.

Da lágrima da filha de Itaporama nasceu a praia do Olho d’Água


Alvo do imaginário popular, com suas lendas, ao ostracismo e abandono do poder público; trecho da orla, que já foi frequentado por diversas famílias nos anos de 1970 e 1980, atualmente sofre com o descaso das autoridades públicas
Localizada no norte da Ilha e situada a 10 quilômetros do centro da cidade, com grande faixa de areia e on­das que chegam a atingir mais de dez metros de altura, a praia do Olho d’Água é conhecida por muitos devido à denominação considerada exótica e rica de elementos culturais. Se antes o trecho era conhecido pela lenda que explica sua origem, atualmente a praia é uma das mais problemáticas, em especial pela ausência das condições ideais de balneabilidade.
Antes de se tornar uma das praias com pior situação para uso e banho da cidade, foi bastante frequentada, especialmente em meados dos anos de 1970 e 1980. Com a construção de rotas na Ilha que davam acesso à sua faixa de areia, diariamente pessoas e mais pessoas deixavam seus lares e se deslocavam até o Olho d’Água.
Muitos desses banhistas desconheciam a lenda referendada por escritores que trata do surgimento deste pedaço da orla. Reza a lenda que, “há muitos e muitos anos, antes da chegada dos europeus às terras de Upaon-Açu”, existia na atual faixa da praia uma aldeia indígena, chefiada por Itapo­rama.
Segundo consta na lenda, Itaporama tinha uma filha, que se apaixonou de forma fervorosa por um “jovem índio da tribo”, que adorava banhar nas águas do mar. Um certo dia, o “jovem índio” decidiu se refrescar quando foi visto pela “Mãe d’Água” que se apaixonou pelo guerreiro e o leva para o seu palácio, nas profundezas do mar.
A filha de Itaporama, sem o seu amor, fica desolada e, ao passar dias sem se alimentar com saudades do grande amor, é enterrada no meio das areias da praia. Mais tarde, brotaram dois olhos d’água, que teriam virado duas nascentes que correm em direção ao mar. Seria devido a esse olho d’água que a praia recebeu seu nome.

A lenda indígena é retratada por dois autores. Um deles é Carlos de Lima, em sua obra intitulada “Lendas do Maranhão”, lançada em 2006. Nela, o escritor descreve o mito como “duas fontes gêmeas” próximas ao mar, referindo-se às nascentes que teriam gerado o nome da praia. Para Carlos de Lima, “dos seus olhos nasceram as duas fontes irmãs que perpetuam até hoje esta história de um amor inatingido”.
 É esse quase elemento utópico do amor entre membros da mes­ma tribo que chamou a atenção do escritor e imortal (ocupante da Cadeira número 11 da Academia Maranhense de Letras), José Ewerton Neto. Em nova edição de seu livro “O Entrevistador de Lendas”, que deverá estar à disposição do público até o fim deste ano, Ewerton também reunirá características da lenda que norteou a praia do Olho d’Água. “Ao contrário de outras, esta [lenda do Olho d´Água] tem um elemento muito singular, que é a presença de itens da cultura indígena. Diferentemente de outras histórias que se pautam em personagens reais e em outros contextos históricos”, disse a O Estado.
Para Ewerton, a lenda do Olho d’Água é uma das mais ricas existentes no estado. “Ela tem elementos riquíssimos e que fazem dela um enredo muito interessante. A começar pelo amor desesperador de uma mulher pelo seu amado. E ainda tem a morte, que gera uma desolação tão gran­de que, dali, nasce o que era até então uma praia belíssima”, finalizou. l
SAIBA MAIS
Bares “famosos”
Com o deslocamento, a cada dia, de novos frequentadores, foram surgindo - ao longo da orla - diferentes estabelecimentos que ofereciam comidas e bebidas de qualidade e que marcaram a história de várias famílias. Entre os mais conhecidos, estiveram o “Roda Viva”, o “Caranguejo Bar” e ainda o “Bar do Bena”. Este último, aliás, era divulgado nacionalmente, pois artistas e jogadores de futebol famosos o procuravam quando queriam conhecer melhor as belezas naturais da cidade.

A praia das “oferendas”

Nos fins de ano e em outros períodos, a praia do Olho d’Água é o cenário escolhido por representantes de terreiros de umbanda de todo o Maranhão. Em 2017, os representantes da religião se reuniram pela 78ª vez e, como de praxe, montaram altar gigante e decorado com frutas, flores, luzes e outros ornamentos. O significado, para os umbandistas, é jogar oferendas para Iemanjá, considerada a “Rainha do Mar”.







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