QUANTO CUSTA O CARNAVAL?

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QUANTO CUSTA O CARNAVAL?

         (Joãozinho Ribeiro)

As manchetes dos principais jornais do país, divulgadas no último final de semana, dão conta do cancelamento ou de redução das verbas públicas destinadas ao carnaval de 2013 em algumas capitais e cidades importantes da Federação. Os motivos do cancelamento e/ou redução dos recursos destinados aos festejos momescos geralmente estão ligados ao estado de emergência ou de calamidade pública decretados pelos atuais prefeitos diante da herança deixada pelas gestões anteriores.

As capitais destacadas na matéria de capa do jornal Folha de São Paulo da edição do último sábado, 19 de janeiro, sob o título “Sem verba, prefeituras cancelam Carnaval”, são: Florianópolis (SC), Porto Velho (RO) e São Luís (MA). A primeira cancelou os desfiles de escolas de samba e destinou a verba de RS 3 milhões para a saúde; a segunda adiou os desfiles para março, com a possibilidade de serem cancelados, sob a alegação de que a gestão anterior não realizou as licitações no tempo hábil; já São Luís, aparece na matéria, com destaque para o cancelamento dos desfiles das escolas, em virtude destas agremiações terem exigido um cachê de R$ 40 mil da prefeitura, que decidiu pela destinação das verbas para a saúde.

A matéria informa ainda que, em São Paulo, foram canceladas festas em São Carlos, Caçapava, Guaratinguetá, Lorena e São José dos Campos, destacando que nesta última houve problemas nas contas do ano passado e que em cidades como Araraquara e Taubaté as festas terão duração mais curta, sendo que em Campinas, uma das cidades mais ricas do Estado, a festa irá durar só dois dias e não terá a presença de trios elétricos.

Em municípios de carnavais tradicionais de outras unidades da Federação, como Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o quadro é o seguinte: Ilhéus (BA) – cancelou o carnaval, em conseqüência de dívidas acumuladas de R$ 2 milhões; Diamantina (MG) – o carnaval quase foi suspenso, mas vai ocorrer de forma econômica; Petrópolis (RJ) – os desfiles de escolas de samba foram cancelados e a verba de R$ 1 milhão será destinada a saúde. Em Guaratinguetá (SP), os desfiles foram cancelados porque não haveria tempo para fazer licitações e repassar as verbas para as escolas de samba locais.
Interessante reproduzirmos, na íntegra, neste artigo, a posição firme tomada por São Luiz de Paraitinga (SP), que se tornou famosa pela preservação do carnaval das marchinhas:

“A Prefeitura de São Luiz de Paraitinga (SP) barrou a realização de shows de funk, rock e música eletrônica planejados para o Carnaval pela cervejaria Skol, patrocinadora do evento. Segundo a prefeitura, as apresentações não se adequavam à tradição carnavalesca de marchinhas. Um panfleto anunciando shows de Jorge Bem Jor, Bonde do Tigrão e do DJ Bob Sinclair vazou na internet e gerou polêmica. A prefeitura informou que o patrocínio previa apenas instalação de barracas para venda de cerveja. De acordo com a administração, um decreto municipal proíbe a veiculação de outro ritmo que não marchinhas durante os dias de carnaval. A Skol disse que os planos ainda seriam propostos e que ‘abraça’ a tradição da cidade”.

Já em nossa São Luís, as cenas deprimentes registradas pela imprensa maranhense, nestas duas últimas semanas, proporcionadas pelos desgastados dirigentes de agremiações carnavalescas da nossa cidade, revelam o grau de isolamento e de despreparo, além da falta de legitimidade para se apresentarem como representantes das brincadeiras e manifestações da nossa cultura popular, às quais se encontram a frente como testas-de-ferro de algum político já se contam décadas.
Não conseguiram se entender e nem expressar um objetivo comum, como bem demonstrou a cobertura de um canal de televisão de grande audiência da cidade, nem mesmo durante a audiência com o prefeito Edivaldo Holanda Júnior, na tentativa de reverter a decisão do chefe do executivo de não mais assegurar a realização do carnaval de passarela, motivada principalmente pelos posicionamentos da Associação Maranhense de Blocos Carnavalescos – AMBC, Academia de Blocos Tradicionais do Estado do Maranhão  e pela União das Escolas de Samba do Estado do Maranhão – UESMA, de não desfilar caso não fosse garantido o pagamento de cachês.
Patético e trágico o teor das entrevistas concedidas, ora defendendo o não desfile, ora afirmando que não foi bem isso que havia sido dito anteriormente, e que a maioria dos blocos e escolas estaria pronta para participar do desfile na passarela. As gravações das entrevistas realizadas pelas emissoras de rádio e TV servem como o melhor testemunho destas intervenções desprovidas do mínimo de coerência e fundamento lógico acerca da problemática instalada em torno do carnaval.
No geral, o que desponta como surpresa para os atuais gestores, grupos, agremiações e pessoas ligadas aos festejos carnavalescos em São Luís é a falência anunciada, já faz algum tempo, de um modelo de patrocínio e financiamento cultural baseado no repasse desenfreado e sem critérios transparentes de recursos públicos a grupos e pessoas que se tornaram verdadeiros proprietários de muitas, assim chamadas “brincadeiras”, que de há muito perderam totalmente os vínculos com as suas comunidades, muitas delas com a perpetuação de dirigentes que fizeram desta condição um meio econômico de vida e hoje se transformaram em verdadeiros agenciadores, despachantes e intermediários dos recursos públicos.
Além destas brincadeiras, que se multiplicam às dezenas a cada ano em nossa capital e nos municípios do interior do Estado, existem outras que se tornaram verdadeiras centrais de produção de eventos, dotadas de todos os recursos materiais, humanos e financeiros, que já não precisariam sequer de patrocínio público, mas que permanecem abocanhando régios financiamentos governamentais, sob a forma de cachês, chanceladas pelos cofres municipais, estaduais e federal, através do incentivo fiscal ou financiamento direto, dissimulado pelo clientelismo eleitoral ou pelo apadrinhamento político, utilizando-se de artifícios, tais como emendas parlamentares, convênios e arremedos de editais, cuja publicidade é praticamente inexistente.
Tudo bancado única e exclusivamente com o dinheiro público das prefeituras e do governo estadual, sem nenhuma participação da iniciativa privada, principalmente daqueles segmentos empresariais que mais lucram e se beneficiam com as vendas de seus produtos e serviços neste período, como é o caso das indústrias de bebidas e similares, que em nosso estado gozam de incentivos fiscais e não apresentam nenhuma contrapartida sociocultural; na contramão do que já não mais acontece em cidades de carnavais tradicionais, como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, onde existem acirradas disputas de empresas privadas para patrocinar a maior festa popular brasileira.
Para agravar ainda mais a situação, o Governo do Estado passou a dirigir e induzir o patrocínio público e privado para a “consagração dos consagrados”, leia-se: contratação de artistas de renome nacional, a peso de ouro, em megaeventos, geralmente realizados na Lagoa da Jansen, como foi o caso dos festejos dos 400 anos de São Luís e Reveillon 2012, e ao que parece se repetirá no carnaval de 2013, dando conta da nossa magistral incompetência de entender e aproveitar as potencialidades e os resultados das atividades relacionadas com a Economia Criativa, que bem poderiam ser apropriados por nós maranhenses, sob a forma de trabalho, renda, tributos, direitos autorais, alegria e dignidade humana.
Ao invés desta via de fortalecimento do turismo, da valorização dos nossos artistas e do nosso patrimônio cultural, o que vemos é uma absurda evasão de divisas, proporcionada por essa desnaturada visão política que penaliza a nossa criatividade e a tradição, sob várias formas de transferência de recursos públicos para outras unidades da Federação muito mais ricas que a nossa: 1) sob a forma da encomenda maciça de ‘abadás’ da forte indústria baiana, que neste período estima a confecção e venda de um milhão de unidades, ao preço de R$ 2 mil cada, somente para os seus próprios blocos; 2) sob a forma de cachês milionários para artistas, bandas refugadas, técnicos, trios elétricos, arquibancadas e equipamentos de outros estados; 3) e, por último, sob a forma de pagamento de direitos autorais para escritórios do ECAD localizados em outros estados, pois estes recursos são posteriormente distribuídos obedecendo a procedência dos compositores, artistas e intérpretes titulares da obra musical executada.
Portanto, uma fórmula burra e inadequada, disfarçada sob o mote pomposo de “Carnaval – a mistura é a nossa maior riqueza”. Resta perguntar: riqueza de quem e para quem?
Lembro-me bem da iniciativa do Governo Jackson Lago, em meados de 2007, quando estávamos à frente da Secretaria de Estado da Cultura, da realização de um seminário do então chamado carnaval da maranhensidade, do qual participaram, à época, os secretários de cultura de Recife e da Bahia, a neta do compositor Cartola, Sra. Nilcemar Nogueira, coordenadora do projeto “Mangueira do Amanhã”, experiência desenvolvida pela escola de samba do mesmo nome, na cidade do Rio de Janeiro, e Dra. Sandra Elouf, representando o Ministério Público Estadual.
 A ideia principal era compartilhar experiências de sucesso desenvolvidas em outras capitais e encontrar uma alternativa própria para o patrocínio e financiamento do carnaval maranhense, que aquelas alturas já sofria muitas críticas, por conta da derrama descontrolada de recursos, e cujo modelo já dava fortes sinais de debilidade de gestão e de sustentabilidade econômica, replicando na velha fórmula de mais do mesmo para o benefício dos mesmos, sem nem uma preocupação com o desenvolvimento sociocultural das comunidades.
E por falar em crítica, fomos alvo de muitas, principalmente por parte de algumas pessoas que sempre foram contra o dito carnaval de passarela e que hoje se apresentam na primeira ala do bloco dos descontentes, aparecendo como seus principais defensores nas reportagens televisivas. Disseram na época, por ignorância ou má fé, que não precisávamos de modelos de outros lugares, pois sabíamos organizar nosso próprio carnaval, distorcendo totalmente o real objetivo do seminário, que além do que já foi esclarecido, visava o intercâmbio saudável e necessário entre gestores, artistas e produtores culturais maranhenses e representantes destes segmentos de outras unidades da República Federativa do Brasil.

Pode-se até discordar da atitude do prefeito Edivaldo Holanda Júnior, em função de um ou outro argumento corporativo movido por interesses particulares de defensores de última hora do carnaval de passarela, mas a verdade cristalina é que este formato de financiamento está com os dias contados e precisa urgentemente ser reformulado, sob pena de perdermos até mesmo o apoio da maioria da população a um dos festejos mais tradicionais de nossa cultura popular. Pesquisas informais apontam para um apoio de cerca de 80% dos habitantes a decisão do prefeito de cancelar os recursos que seriam destinados ao carnaval de passarela e repassá-los para a saúde.

Quem sabe a chamada crise do carnaval de São Luís não seja um excelente momento para refletirmos sobre as dificuldades e potencialidades que podem ser revertidas para um novo ciclo de valorização e desenvolvimento da nossa cultura popular, sem necessidade de apadrinhamentos políticos e de coronelismos culturais?

Acredito seriamente que este seja o compromisso maior do atual presidente da Fundação Municipal de Cultura, Prof. Francisco Gonçalves, e um dos primeiros passos concretos para romper com este dilema que impede sobremaneira o debate e a implantação de uma política pública de cultura de horizontes mais ampliados, que contemple as suas dimensões simbólica, econômica e cidadã.

Para a mudarmos a política cultural se faz necessário mudar a atual cultura política!
        

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