Zagueiro MIMICA do Sampaio sente orgulhoso de morar no Barreto

'Eu sou luz para os jovens do Barreto'
Zagueiro do Sampaio Corrêa, Mimica mantém seus laços fortes com o bairro onde nasceu e cresceu, o Barreto.
Anderson Corrêa
Da equipe de O Estado - Caderno DOM, do dia 03.nov.2013
Da equipe de O Estado - Caderno DOM, do dia 03.nov.2013
O sonho de muitos garotos é ser jogador de futebol. Com Ademilson Silva Marques, o Mimica, não poderia ser diferente. Desde cedo estimulado pelo pai e pelos irmãos, o zagueiro do Sampaio Corrêa, time que acaba de conquistar vaga na Série B do Campeonato Brasileiro, se envolveu com o esporte. O pai, Benedito Marques, treinava um time amador no bairro onde a família do jogador mora até hoje, o Barreto.
"Nasci em uma comunidade pobre, onde a diversão dos meninos era jogar bola. Sempre fui viciado por futebol. Como morava perto do estádio Castelão, muitas vezes fui até lá jogar com os irmãos e vizinhos. Muitas vezes jogamos naquela vala que fica entre o campo e a arquibancada", conta o zagueiro.
Foi nas brincadeiras de rua que ele conseguiu o apelido que hoje o faz conhecido. "Mimica na verdade era um gato preto lá da rua onde eu morava. E os meus amigos, na brincadeira, começaram a me chamar assim. Acabou pegando e hoje adotei como nome artístico", esclarece.
O zagueiro recorda que, por muito tempo, para ajudar os pais no sustento da casa, em dias de jogo vendia bombons, picolés e frutas na porta do estádio. "Sempre procurava vender as coisas bem rápido para poder ver o fim do jogo. Então, eu ia para a arquibancada ficar com a torcida do Tubarão. Pegava a bandeira e torcia pelo o time", relata.
Outras vezes, ficava vigiando os carros dos atletas que participavam da partida. Esses eram, para ele, momentos de grande alegria, porque tinha a chance de conversar com os jogadores e conseguir ver mais de perto os jogos. "Em 1997, quando o Sampaio Corrêa foi campeão, vigiei o carro do Adãozinho. Ele tinha um Monza verde e me dava conselhos. Eram pessoas boas e humildes. Tratavam as pessoas de igual para igual. E hoje estou conquistando o mesmo espaço que um dia eles conquistaram", afirma.
Primeiros lances - A carreira começou aos 17 anos em times amadores. Em 2005, foi contratado pelo Chapadinha, a primeira equipe profissional, e somente em 2008 entrou para o elenco do time boliviano. Já jogou pelo Botafogo (PB) e pelo Iape (MA); foi emprestado para o Vila Nova (GO); passou pelo Sertãozinho (SP) e retornou ao Sampaio para ajudar na última conquista.
Na família de nove irmãos, ele não era o melhor com a bola nos pés, mas foi o único que chegou aos grandes times do estado. "Eu sempre fui alto e meus irmãos tinham mais qualidade. Todo mundo achava que os dois mais novos iriam ser jogadores. Eles eram craques. Eu não nasci com esse dom. Mas tive força e confiança. Briguei pelo meu espaço. Graças a Deus, fui determinado. Tive vontade e coragem", ressalta.
Nem sempre Mimica foi zagueiro. A posição que mais gostava era a lateral direita, mas foi um dos grandes apoiadores de sua carreira, o tio Jereba, que propôs que se adaptasse à nova posição. Com 1,85m de altura e muita força, ele seguiu o conselho.
O tio Jereba, que tem uma escolinha de futebol bastante popular no estado, foi, além de um grande incentivador na carreira futebolística, um homem muito importante na vida pessoal. Por causa de problemas familiares, Mimica acabou tendo o tio como um exemplo. "Meu pai nunca foi muito presente na minha vida e dos meus irmãos. Ele era alcoólatra. Mas tive o prazer de conhecer o Jereba. Sou o que sou por causa dele. Sempre que vou à sua casa, saio de lá renovado", afirma.
Da mesma forma, o jogador quer ser visto como exemplo para a comunidade onde nasceu e vive até hoje com sua mãe, Lucimara Silva. Ele se sente abençoado por Deus. Por isso, acredita que não pode esquecer suas origens. "Se esquecer de onde vim, não conseguirei chegar a lugar nenhum. Se Deus me fez luz para minha família, é porque sabe que posso ajudá-los", assevera.
Origens - Segundo Mimica, muitos o criticam por ainda morar no Barreto, um dos bairros com maiores índices de criminalidade de São Luís. "Mesmo que eu conquiste uma Copa do Mundo, não vou mudar o que sinto pelo meu bairro. Uma amiga me contou que me viu na televisão e disse que era seu vizinho. As pessoas em volta riram dela porque não acreditavam que um jogador do Sampaio moraria no Barreto. Existe muito esse preconceito", diz.
Para ele, sua maior tristeza é ver sua comunidade sendo dominada pela droga. "Eu ligo a televisão pela manhã e vejo a quantidade de gente presa, pessoas que conheci. É triste ouvir notícias de que alguém conhecido pegou um tiro e morreu. Somos seres humanos, independentemente das circunstâncias. Não quero que ninguém morra. Pode ser até um ladrão, mas os familiares também vão sofrer", pondera em prantos.
Mimica também chora quando se lembra do irmão que está preso por causa de drogas. "Dói muito quando penso nele e no meu pai. Penso no meu filho também. Converso com ele e peço que encontre boas amizades, porque amizades ruins te levam para um mau caminho", comenta. Mas ele acredita que pode realizar muita coisa para ajudar sua comunidade. "As crianças me olham e dizem que querem ser como eu quando crescer. Eu sou luz para jovens do Barreto. Quero que Deus continue me abençoando para não esquecer minhas raízes", persevera.
Zagueiro quer chegar à Série A
Como a maioria dos jogadores, Ademilson Marques, o Mimica, espera ser escalado para a Seleção Brasileira de Futebol. Enquanto isso não se concretiza, aguarda ansiosamente a volta do Sampaio Corrêa à Série B do Brasileirão. "É bom acordar e saber que realizei um sonho. Conquistei mais um objetivo na minha vida. Mas ainda tenho muito a conquistar", afirma.
Mimica conta que está em seus planos chegar à Série A. "Muitos achavam impossível chegar à Série B, mas chegamos. Se trabalhar, tiver vontade, concentração e humildade, a gente vai alcançar esse sonho", diz. Para ele, só é possível construir algo sólido na vida se a pessoa tiver humildade. "Tenho isso comigo. Contudo, é algo difícil de encontrar por aí. Muita gente, quando conquista algo, logo perde a humildade. Sou pobre, mas ando com minha cabeça erguida", comenta.
O zagueiro lembra que a mãe foi muito importante para ter essa consciência. Ele conta que ela já deixou de comer para alimentar os nove filhos e que muitas vezes foi a pé para o serviço para deixar o dinheiro da passagem do ônibus para ele ir ao treino. "Quero trabalhar com dignidade para ser bem sucedido na vida. Quando parar de jogar, não quero depender do auxílio de um ou de outro. Quero dar conforto à minha família", frisa.
Mimica, que é pai de Anderson, de 8 anos, e namora Salma Serrão, está sempre frequentando a igreja. "Não tenho religião, mas creio em Deus e confio Nele. Onde Deus está, lá estou, porque Ele é sabedoria e preciso disso para vencer", assegura.
Por isso, o jogador evita as badalações, não se enche de vaidades e prefere ficar com a família. "Jogo bola com meu filho, vou ao shopping com ele e ao cinema com minha namorada. Procuro evitar a noite, perder sono, pois isso influencia no meu trabalho. Gosto de pagode, mas sei o momento certo para isso. Para se conquistar sonhos tem que abrir mão de certas coisas”, afirma o zagueiro, que ficou quatro meses longe das badalações para se concentrar no acesso à Série B pelo Sampaio.
Após o futebol, Mimica, que concluiu o Ensino Médio, pretende continuar os estudos. Quer ser administrador e fazer Educação Física. Os planos também são para o filho. "É sonho de qualquer pai ter um filho jogador de futebol. Mas que seja feita vontade de Deus. Quero vê-lo formado, fazendo o que eu não pude fazer. Independentemente de jogador, médico, professor, quero que ele ande de cabeça erguida e seja humilde", finaliza.
RAIO-X
Nome completo:
Ademilson Silva Marques
DATA DE NASCIMENTO
22 de novembro de 1985
PROFISSÃO
Zagueiro do Sampaio Corrêa
NATURALIDADE
São Luís (MA)
FILIAÇÃO
Benedito Casteliano Marques
Lucimara Cruz Silva
ESTADO CIVIL
Solteiro, namora Salma Serrão
FILHO
Anderson, 8 anos
QUALIDADE
Humildade e perseverança
DEFEITO
Ingenuidade
ALEGRIA
Conquistar um título para o Sampaio e dar conforto para sua mãe
TRISTEZA
As condições do Barreto, bairro onde vive
SAUDADE
Da infância, quando não tinha compromisso com nada
PLANO
Ser bem-sucedido na vida
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